Meningite.

O sistema nervoso central é envolvido por membranas conjuntivas denominadas meninges e que são classicamente três: dura-máter. aracnoide e pia-máter. A aracnoide e a pia-máter, que no embrião constituem um só folheto, são, às vezes, consideradas como uma formação única, a leptomeninge, ou meninge fina, distinta da paquimeninge, ou meninge espessa, constituída pela dura-máter.

Dura-Máter:

A meninge mais superficial é a dura-máter. espessa e resistente, formada por tecido conjuntivo muito rico em fibras colágenas. contendo vasos e nervos. A dura-máter do encéfalo difere da dura-máter espinhal por ser formada por dois folhetos, externo e interno, dos quais apenas o interno continua com a dura-máter espinhal. A dura-máter, em particular seu folheto externo, é muito vascularizada. No encéfalo, a principal artéria que irriga a dura-máter é a artéria meníngea média, ramo da artéria maxilar. A dura-máter, ao contrário das outras meninges, é ricamente inervada. Como o encéfalo não possui terminações nervosas sensitivas, toda ou quase toda a sensibilidade intracraniana se localiza na dura-máter, responsável, assim, pela maioria das dores de cabeça.

Aracnoide:

Membrana muito delicada, justaposta à dura-máter, da qual se separa por um espaço virtual, o espaço subdural, contendo pequena quantidade de líquido necessário à lubrificação das superfícies de contato das duas membranas. A aracnoide separa-se da pia-máter pelo espaço subaracnóideo, que contém o líquido cérebro-espinhal, ou liquor,

havendo ampla comunicação entre o espaço subaracnóideo do encéfalo e da medula.

Considera-se também como pertencendo à aracnóide as delicadas trabéculas que atravessam o espaço para se ligar à pia-máter, e que são denominadas trabéculas aracnoides.

Pia-máter:

 A pia-máter é a mais interna das meninges, aderindo intimamente à superfície do encéfalo e da medula, cujos relevos e depressões acompanha, descendo até o fundo dos sulcos cerebrais. Sua porção mais profunda recebe numerosos prolongamentos dos astrócitos do tecido nervoso, constituindo assim a membrana pioglial. A pia-máter dá resistência aos órgãos nervosos, pois o tecido nervoso é de consistência muito mole. De tal modo ela contém o encéfalo e a medula, que, em peças não fixadas, pequenas incisões da pia-máter resultam em hérnias de substância nervosa. A pia-máter acompanha os vasos que penetram no tecido nervoso a partir do espaço subaracnóideo, formando a parede externa dos espaços perivasculares. Nestes espaços existem prolongamentos do espaço subaracnóideo, contendo liquor, que forma um manguito protetor em torno dos vasos, muito importante para amortecer o efeito da pulsação das artérias sobre o tecido circunvizinho.

meninges

Liquor

O encéfalo é envolvido e protegido pelas meninges dura-máter, aracnoide-máter e pia-máter. O LCR de proteção, no qual estão imersos o encéfalo e a medula espinal, tem capacidade para isolar estas estruturas de traumatismos leves e moderados. O LCR é secretado para os ventrículos pelas células ependimárias do plexo coroide, circula através do sistema ventricular, e é reabsorvido pelo sistema venoso através das vilosidades aracnoides. As barreiras hematencefálica e hematoliquórica protegem o encéfalo de substâncias encontradas no sangue que poderiam comprometer o funcionamento encefálico.

O liquor é um fluido aquoso e incolor que ocupa o espaço subaracnóideo e as cavidades ventriculares. A junção primordial do liquor é de proteção mecânica do sistema nervoso central, formando um verdadeiro coxim líquido entre este e o estojo ósseo.

Por outro lado, em virtude da disposição do espaço subaracnóideo, que envolve todo o sistema nervoso central, este fica totalmente submerso em líquido e, de  acordo com o princípio de Arquimedes, o torna muito mais leve, o que reduz o risco de traumatismos do encéfalo resultantes do contato com os ossos do crânio.

O líquor renova-se completamente a cada 8 horas.

Barreiras Imunológicas do SNC

Duas barreiras, a barreira hematoencefálica e a barreira hematoliquórica, proporcionam os meios para manutenção da estabilidade do ambiente químico do encéfalo. Apenas as

 moléculas de água, dióxido de carbono e oxigênio conseguem entrar no encéfalo com relativa facilidade. O transporte de outras substâncias entre o encéfalo e o sangue é mais lento e mais controlado.

A barreira hematencefálica depende das características únicas dos capilares encefálicos. As células endoteliais dos capilares encefálicos são unidas por junções oclusivas contínuas. Além disso, a maior parte dos capilares encefálicos é envolta por uma membrana basal e por processos de células de suporte do encéfalo denominados astrócitos (pés astrocitários). A barreira hematencefálica possibilita a passagem de substâncias essenciais, ao mesmo tempo em que exclui materiais indesejados.

Grandes moléculas, como proteínas e peptídeos, são em grande parte impedidas de atravessar a barreira hematencefálica. Lesões cerebrais agudas, como as causadas por traumatismo e infecção, aumentam a permeabilidade da barreira hematencefálica e alteram as concentrações encefálicas de proteínas, água e eletrólitos.

Meningite

Quadro Clínico:

A meningite pode apresentar-se como doença aguda fulminante que evolui rapidamente em algumas horas ou como infecção subaguda que piora de forma progressiva ao longo de vários dias.

A tríade clínica clássica da meningite consiste em febre, cefaleia e rigidez de nuca, porém essa tríade clássica pode não estar presente.

A queda do nível de consciência ocorre em > 75% dos pacientes e varia da letargia ao coma. Verifica-se a presença de febre e cefaleia, rigidez de nuca ou alteração do nível de consciência em quase todo paciente com meningite bacteriana.

Náuseas, vômitos e fotofobia também são queixas comuns.

As crises convulsivas ocorrem como parte da apresentação inicial da meningite bacteriana ou durante a evolução da doença em 20-40% dos pacientes. As crises focais costumam advir de isquemia arterial ou infarto focal, trombose venosa cortical com hemorragia ou edema focal.

Tipos:

Existem dois tipos de meningite infecciosa aguda: meningite purulenta aguda (geralmente bacteriana) e meningite linfocítica aguda (geralmente viral). Os fatores responsáveis pela gravidade da meningite incluem fatores de virulência do patógeno, fatores do hospedeiro, edema encefálico e sequelas neurológicas permanentes.

Meningite Bacteriana

A meningite bacteriana é uma infecção purulenta aguda no interior do espaço subaracnóideo. Está associada a uma reação inflamatória do SNC, que pode resultar em diminuição da consciência, crises convulsivas, aumento da pressão intracraniana (PIC) e acidente vascular encefálico (AVE).

A maioria dos casos de meningite bacteriana é causada por Streptococcus pneumoniae (pneumococo) ou Neisseria meningitidis (meningococo), exceto em recém-nascidos (na maioria das vezes infectados por estreptococos do grupo B). Outros agentes patogênicos causadores de infecções em adultos são bacilos gramnegativos e Listeria monocytogenes. Haemophilus influenzae foi durante décadas a principal causa de meningite. No entanto, a incidência de infecção causada por esse microrganismo tem diminuído drasticamente nos últimos anos por causa da vacinação contra H. influenzae.

Fisiopatologia:

As bactérias que mais comumente causam meningite, S. pneumoniae e N. meningitidis, colonizam primeiro a nasofaringe por adesão às células epiteliais nasofaríngeas. Em seguida, são transportadas por meio das células epiteliais, em vacúolos formados pela membrana, para o espaço intravascular ou invadem esse espaço, separando as junções estreitas apicais das células epiteliais colunares. Na corrente sanguínea, as bactérias são capazes de evitar a fagocitose por neutrófilos e a atividade bactericida mediada pelo complemento devido à presença de uma cápsula polissacarídica. As bactérias presentes no sangue atingem, em seguida, o plexo coroide intraventricular, onde infectam diretamente as células epiteliais do plexo e ganham acesso ao LCS.

Algumas bactérias, como a S. pneumoniae, aderem as células endoteliais dos capilares cerebrais e, em seguida, migram através dessas células ou entre elas para atingir o LCS. As bactérias são capazes de se multiplicarem rapidamente dentro do LCS em virtude da ausência de defesas imunes eficazes por parte do hospedeiro.

No processo fisiopatológico da meningite bacteriana, os microrganismos bacterianos se replicam e são submetidos à lise no LCR, liberando endotoxinas ou fragmentos da parede celular. Essas substâncias incitam a liberação de mediadores inflamatórios, o que desencadeia uma complexa sequência de eventos que possibilita o movimento de patógenos, neutrófilos e albumina através da parede capilar até o LCR. À medida que os agentes patogênicos entram no espaço subaracnoide, causam uma inflamação que se caracteriza por um exsudado purulento.

Pode se desenvolver uma tromboflebite nas veias da ponte e nos seios durais ou a obliteração das arteríolas por inflamação, provocando congestão vascular e infarto nos tecidos circundantes.

Em última análise, as meninges se tornam espessas e formam aderências.  Essas aderências podem invadir os nervos cranianos, dando origem à paralisia de nervos cranianos, ou podem prejudicar o escoamento de LCR, causando hidrocefalia.

Componentes bacterianos são agentes importantes de inflamação meníngea, causando liberação para dentro do espaço subaracnoide de várias citocinas próinflamatórias, como interleucina-1 e o fator de necrose tumoral a partir das células endoteliais e meníngeas, macrófagos e micróglia.

As citocinas parecem aumentar a passagem de leucócitos ao ativarem várias famílias de moléculas de adesão que interagem com os receptores correspondentes nos leucócitos. As citocinas também podem aumentar a afinidade de ligação de uma selectina leucocitária, molécula de adesão do leucócito, para o seu receptor na célula endotelial, e podem, desse modo, contribuir ainda mais para o trânsito de neutrófilos para dentro do espaço subaracnoide.

Na meningite bacteriana, os neutrófilos se movem para dentro do espaço subaracnoide, mas não são capazes de controlar a infecção bacteriana porque suas propriedades fagocíticas são ineficazes como resultado de uma falta de atividade opsônica e bactericida. Dentro do espaço subaracnoide, os neutrófilos liberam produtos como prostaglandinas, metaloproteinases da matriz e radicais livres que rompem as junções ocludentes intercelulares endoteliais e a lâmina basal subendotelial.

O aumento da permeabilidade vascular local da barreira hematoencefálica pode causar edema cerebral que pode ser causado também pelo aumento da pressão do LCR como resultado da obstrução do fluxo de líquido cefalorraquidiano por causa da inflamação intersticial nas vilosidades aracnoides.

Quadro Clínico:

Febre de início agudo, cefaleia generalizada, vômitos e rigidez da nuca são comuns a muitos tipos de meningite.

 A maioria dos pacientes com meningite piogênica adquirida na comunidade teve infecção do trato respiratório superior ou doença febril inespecífica, otite média aguda (ou mastoidite), ou pneumonia.

 Mialgia, particularmente em pacientes com doença meningocócica, dor nas costas e fraqueza generalizada são sintomas frequentes.

 A doença costuma progredir rapidamente para confusão, obnubilação e perda de consciência. Ocasionalmente, o início pode ser menos agudo, com sinais meníngeos presentes desde alguns dias até uma semana.

Normalmente são observados sinais de irritação meníngea, com rigidez da nuca, sinal de Kernig e sinal de Brudzinski.

OBS: As Manobras

Brudzinski: Posicionar o paciente em decúbito dorsal e membros estendidos; Repousar uma das mãos no tórax do paciente e, com outra colocada na região occipital, executar uma flexão forçada -> Quando positivo, observa-se que o paciente flete os membros inferiores involuntariamente, podendo haver expressão de dor na face do paciente.

Kernig: Posicionar o paciente em decúbito dorsal; Promover flexão da coxa sobre o quadril, em ângulo de 90°, e em seguida promover a extensão da perna sobre a coxa -> Quando positivo, observa-se que o paciente tenta interromper o movimento ao sentir dor.

Atenção: o sinal presente bilateralmente sugere irritação meníngea. Se unilateral, pode indicar doença radicular.

Embora a tríade clássica – febre, rigidez da nuca e alteração de consciência – esteja presente em apenas 44% dos episódios, uma combinação de dois entre quatro sintomas

(cefaleia e a tríade clássica) pode ser encontrada em 95% dos pacientes.

Os achados de meningite podem passar facilmente despercebidos em: lactentes; pacientes obnubilados ou idosos com insuficiência cardíaca ou pneumonia; e indivíduos imunossuprimidos. Esses pacientes podem ter meningite sem sinais meníngeos proeminentes.

A presença de erupção cutânea de tipo petequial ou equimótica em um paciente com sinais meníngeos indica quase sempre infecção meningocócica e requer pronto tratamento em virtude da rapidez com que essa infecção pode evoluir. Raramente ocorrem lesões petequiais ou equimóticas extensas na meningite causada por S. pneumoniae, H influenzae ou ecovírus tipo 9.

Muito raramente, lesões cutâneas quase sempre indistinguíveis daquelas da bacteremia meningocócica podem ocorrer em pacientes com endocardite aguda por S. aureus. Esses pacientes podem apresentar também sinais meníngeos e pleocitose no LCR, secundários a meningite estafilocócica ou a infarto cerebral embólico. Habitualmente, ao menos uma ou duas das lesões desses pacientes apresentam características de púrpura purulenta, sendo possível reconhecer estafilococos à coloração pelo Gram.

Morfologia:

No exame macroscópico, o exsudato purulento no espaço subaracnoide é mais abundante nas cisternas na base do encéfalo e ao longo das convexidades do sulco de Sylvius e rolândicas, que são expansões do espaço subaracnoide. Embora nem o organismo infectante nem o exsudato inflamatório invadam diretamente o tecido cerebral, o cérebro subjacente se torna congestionado e edema toso.

A eficácia da barreira pia! geralmente impede a meningite bacteriana de causar abscesso cerebral; quando esses dois processos coexistem, a sequência geralmente é que um abscesso inicial vaze seu conteúdo para o sistema ventricular e produza meningite secundária.

O exsudato inflamatório pode se estender para estruturas adjacentes em torno de espaços perivasculares, especialmente das artérias e veias que carregam uma camada de pia-máter e membrana aracnoide à medida que entram no cérebro a partir da superfície cortical.

A tromboflebite cortical resulta da estase venosa e da inflamação meníngea adjacente. Pode se seguir infarto do tecido cerebral. Comprometimento das artérias corticais e piais com formação de aneurismas periféricos e oclusão ou estreitamento vascular (relacionado a espasmo e/ ou arterite) da porção supraclinóidea da artéria carótida interna na base do cérebro ocorre em aproximadamente 15% dos pacientes com meningite.

A lesão de nervos cranianos ocorre em áreas onde se acumula exsudato denso; o terceiro e sexto nervos cranianos são também vulneráveis à lesão pela pressão intracraniana aumentada.

 Ventriculite, que provavelmente ocorre na maioria dos casos de meningite bacteriana, progride raramente para empiema ventricular.

À medida que os exsudatos continuam a se acumular, a obstrução do fluxo de LCR pode resultar em hidrocefalia. A obstrução dos forames de Luschka e Magendie, na base do quarto ventrículo, resulta em hidrocefalia obstrutiva ou não comunicante, ao passo que a obstrução das granulações aracnoides nos seios venosos resulta em hidrocefalia comunicante.

Diagnóstico:

O diagnóstico de meningite bacteriana se baseia no histórico e no exame físico, juntamente com os dados de testes de laboratório. Os resultados de uma punção lombar, necessários para um diagnóstico preciso, incluem LCR purulento e turvo sob pressão crescente.

Ocasionalmente, o uso anterior de antibióticos limita a sensibilidade da cultura, e, nesse caso,

pode ser usado o teste de aglutinação do látex ou a reação em cadeia da polimerase (PCR) para as espécies de Listeria, N. meningitidis e H. influenzae.

Como as complicações associadas à punção lombar incluem o desenvolvimento de uma hérnia cerebral potencialmente fatal, pacientes de risco (aqueles com imunossupressão, que tiveram uma crise convulsiva na última semana, têm papiledema ou são portadores de anormalidades neurológicas específicas) devem realizar uma tomografia antes de se submeter ao procedimento.

Exame do Líquido Cefalorraquidiano: A pressão inicial do LCR em geral está moderadamente elevada (de 200 a 300 mm H2 0 em adultos). Elevações importantes 450 mm H2 0) ocorrem em pacientes com edema cerebral agudo complicando a meningite, mesmo na ausência de lesão com efeito de massa.

Bacterioscopia com Gram: No momento da hospitalização, a maioria dos pacientes com meningite piogênica apresenta grande quantidade de bactérias no LCR. Exame cuidadoso do esfregaço do centrifugado do LCR corado pelo Gram pode revelar o agente etiológico em 60% a 80% dos casos.

Procedimentos Especiais de Tipagem: A reação em cadeia da polimerase (PCR) de largo alcance, que pode ser realizada no LCR em uma hora e meia, pode diagnosticar a meningite bacteriana em pacientes nos quais a terapia antimicrobiana tenha começado antes de punção lombar ou quando as culturas forem negativas ou ainda quando houver suspeita de infecção de origem bacteriana. No entanto, PCR em tempo real específica para diagnóstico de meningite pneumocócica e meningocócica está disponível atualmente, somente em contexto de pesquisa. A sensibilidade e a especificidade da tipagem rápida de antígenos pela aglutinação do látex são mais altas (> 90%) para H. influenzae, mais baixas para S. pneumoniae e consideravelmente mais baixas para N meningitidis.

Contagem de Células: A contagem de células deve ser feita imediatamente porque essas células começam a degenerar em 90 minutos. A contagem normal de leucócitos no LCR é menos de 5/mm³ (todos mononucleares). A contagem celular na meningite não tratada normalmente varia entre 100 e 10.000/mm³, predominando inicialmente leucócitos polimorfonucleares (> 80%) aparecendo subsequentemente o perfil linfomononuclear.

Glicose: A glicose no LCR está reduzida a valores de 40 mg/ dL ou menos (ou < 50% do nível de glicemia simultânea) em 50% dos pacientes com meningite bacteriana; esse achado pode ser valioso para distinguir a meningite bacteriana da maioria das meningites virais ou infecções parameníngeas. Entretanto, um valor normal da glicose no LCR não exclui o diagnóstico de meningite bacteriana.

Proteínas: O nível de proteínas no LCR lombar é geralmente elevado (mais de 100 mg/dL), mas valores mais altos são mais frequentemente observados na meningite pneumocócica. Elevações extremas, 1000 mg/dL ou mais, podem indicar bloqueio subaracnoide com obstrução do fluxo de LCR. Valores acima de 15 mg/ dL no LCR ventricular são considerados anormais. Se a punção lombar for traumática, o nível de proteína no LCR pode ser corrigido subtraindo-se 1 mg/ dL para cada 1.000 hemácias.

Tratamento:

O tratamento inclui a administração urgente de antibióticos, enquanto os testes de diagnóstico prosseguem (tratamento empírico). O atraso no início da terapia antimicrobiana, mais frequentemente devido à realização de exames por imagem antes da realização da punção lombar ou à transferência para outro centro médico, pode resultar em maus resultados. A escolha inicial dos antibióticos abrange a cobertura de largo espectro com cefalosporina de terceira geração, vancomicina e algumas vezes ampicilina. O ajuste posterior da terapia com antibióticos deve ser direcionado pelo resultado das culturas liquóricas.

Antibióticos efetivos produzem rapidamente a lise do agente patogênico, que produz mediadores inflamatórios com potencial para exacerbar as anormalidades da barreira hematencefálica. Para suprimir essa inflamação patológica, a terapia adjuvante com corticosteroides deve ser conjuntamente administrada a cada vez ou imediatamente antes da primeira dose de antibióticos em pacientes de todas as idades.

OBS: A hipertensão intracraniana é uma complicação esperada da meningite bacteriana e a principal causa de embotamento e como na doença. Os sinais de elevação da PIC incluem deterioração ou redução do nível de consciência, papiledema, pupilas dilatadas e pouco reativas, paralisia do nervo craniano VI, postura de descerebração e presença da tríade de Cushing (bradicardia, HAS e respiração irregular). A complicação mais desastrosa da hipertensão intracraniana é a herniação cerebral.

Meningite Viral

A meningite viral de muitas maneiras se manifesta como a meningite bacteriana, mas o curso é menos grave e os achados no LCR são significativamente diferentes.

Existem linfócitos no líquido, em vez de células polimorfonucleares, o teor de proteínas é apenas moderadamente elevado e o teor de açúcares é geralmente normal.

A meningite viral pode ser causada por vários vírus diferentes, na maioria das vezes enterovírus, incluindo vírus Coxsackie, poliovírus e vírus ECHO. Outras incluem o vírus Epstein Barr, vírus da caxumba, HSV, e vírus do Nilo Ocidental.

Quadro Clínico:

As características clínicas da meningite por enterovírus em crianças maiores e em adultos começam muitas vezes abruptamente com cefaleia (de 85% a 100%), febre (de 80% a 100%) e rigidez de nuca (de 50% a 80%).

Em alguns pacientes, a evolução é bifásica, com a fase prodrômica inicial caracterizando-se por febre de baixo grau e sintomas inespecíficos (mal-estar, dor de garganta, diarreia), seguida de uma segunda fase em que as meninges são acometidas, com desenvolvimento de febre mais alta, náuseas, vômitos, mialgia, fotofobia e rigidez da nuca.

Podem coexistir outras síndromes enterovirais, particularmente pleurodinia ou pericardite resultante de coxsackievírus. Erupção cutânea pode ser uma manifestação de infecções causadas por ecovírus, particularmente ecovírus tipo 9, coxsackievírus A9 e A16, e enterovírus 71; os três últimos causam a doença de mão-pé-boca, que pode ocorrer isoladamente ou acompanhar meningite asséptica.

Epidemias de ecovírus 9 frequentemente produzem síndromes de exantema, enantema (pequenas lesões brancas acinzentadas semelhantes a manchas de Koplik na mucosa bucal) e meningite asséptica, isoladamente ou em combinação; erupção macular e petequial na presença de síndrome meningítica não deve ser confundida com a meningite meningocócica.

Anormalidades neurológicas que afetam o cérebro são observadas raramente, porque esses casos seriam definidos como encefalite ou meningoencefalite em vez de meningite enteroviral.

Em indivíduos agamaglobulinêmicos nos quais se desenvolve infecção enteroviral do SNC, a meningite pode evoluir para meningoencefalite crônica com múltiplas características neurológicas, incluindo cefaleia, convulsões, ataxia, fraqueza, perda auditiva, obnubilação e coma. A evolução clínica da meningite enteroviral é benigna, mesmo na minoria dos pacientes nos quais o início é agudo ou mesmo fulminante. Os sintomas costumam regredir em uma semana em crianças, mas podem continuar durante várias semanas nos adultos.

Diagnóstico:

Duas técnicas de avaliação são capazes de ajudar a determinar se existe irritação das meninges: O sinal de Kernig e o sinal de Brudzinski.

Cefaleia, febre, rigidez da nuca, confusão mental, vômito e pleocitose são características de inflamação meníngea e são comuns a muitos tipos de meningite (ex: bacteriana, fúngica, viral, química) e também a alguns processos parameníngeos.

Os sinais no LCR são mais úteis para distinguir entre esses processos.

Embora a pleocitose com predominância de linfócitos sem hipoglicorraquia seja característica de meningite viral (geralmente enteroviral ou por vírus do herpes simples tipo 2 [HSV2]) ou meningoencefalite vira! (HSV-1), o resultado inicial do LCR pode exibir uma resposta polimorfonuclear (de < 60%) que rapidamente se torna mononuclear.

Encefalite por HSV-1 é sugerida por alterações ao exame neurológico (disfasia, hemiparesia, alucinações olfatórias, outros sinais de acometimento do lobo temporal, convulsões), anormalidades na RM dos lobos orbitofrontal e temporal mediai, e alterações eletroencefalográficas sugestivas no lobo ou lobos temporais.

Erupção cutânea, febre e cefaleia da febre maculosa das Montanhas Rochosas podem sugerir infecção meningocócica, mas as preferências geográficas e sazonais da primeira podem fornecer indícios importantes. Aproximadamente 10% dos pacientes hospitalizados com febre maculosa das Montanhas Rochosas têm contagens celulares no LCR mais altas que 100/mm3 (>70% polimorfonucleares), e, por isso, essa condição pode inicialmente ser confundida com meningite bacteriana.

A erupção cutânea associada a infecções por enterovírus geralmente consiste em máculas e pápulas eritematosas na face, no pescoço e no tronco.

Hemorragia subaracnóidea aguda pode ser confundida com meningite bacteriana em virtude de cefaleia, rigidez de nuca e vômito. Entretanto, a hemorragia subaracnóidea normalmente tem um início mais abrupto, não tem febre prodrômica e evidencia sangue no espaço subaracnoide aos exames de TC ou do LCR.

Em pacientes com a síndrome neuroléptica maligna, podem se desenvolver febre, rigidez generalizada e um nível de consciência flutuante com instabilidade autonômica e leucocitose. A maioria das anormalidades laboratoriais específicas nesses pacientes é um nível acentuadamente elevado de creatina quinase.

Num paciente com meningite, mas cujo LCR não revela o agente etiológico em esfregaço corado pelo Gram, particularmente quando o nível de glicose no LCR é normal e a pleocitose polimorfonuclear é atípica, devem ser considerados, no diagnóstico diferencial, certos processos tratáveis que podem simular meningite bacteriana:

Infecções parameníngeas: A presença de infecções nas proximidades das meninges (infecções crônicas de ouvido ou dos seios paranasais, abscesso pulmonar) pode predispor à ocorrência de abscesso cerebral, abscesso epidural (cerebral ou espinhal), empiema subdural ou flebite piogênica de seio venoso. Podem surgir sintomas neurológicos associados a esses tipos de lesão no curso da meningite bacteriana primária. A possibilidade de sua presença deve manter o médico alerta para a necessidade de pesquisar cuidadosamente a presença de um processo infeccioso ocupando espaço no SNC. O isolamento de um organismo anaeróbico deve sugerir a possibilidade de ruptura intraventricular de um abscesso cerebral.

Endocardite bacteriana: Meningite bacteriana pode ocorrer durante endocardite bacteriana causada por organismos piogênicos como o S. aureus e enterococos. Na endocardite bacteriana subaguda, infartos embólicos estéreis do cérebro podem produzir sinais meníngeos e uma pleocitose com até várias centenas de células, inclusive leucócitos polimorfonucleares. Neste caso, devem ser procurados histórico de  manipulação dentária, febre e anorexia precedendo a meningite. Está indicada a pesquisa cuidadosa de sopros cardíacos e sinais periféricos de endocardite.

Meningite “química”: Os achados clínicos e do LCR (pleocitose polimorfonuclear e mesmo nível reduzido de glicose) da meningite bacteriana podem ser produzidos por inflamação induzida quimicamente. Meningite aguda após punção lombar diagnóstica ou anestesia espinhal pode resultar da contaminação bacteriana ou química do equipamento ou agente anestésico. Meningite química, caracterizada por pleocitose polimorfonuclear, hipoglicorraquia e um período latente de três a 24 horas ocorre após 1% dos mielogramas com metrizamida. Meningite química endógena resultando de material de um tumor epidermoide ou um craniofaringioma que libera material para o interior do espaço subaracnoide pode causar pleocitose polimorfonuclear e hipoglicorraquia; nesses casos, pode ser visto material birrefringente à microscopia polarizada do sedimento do LCR.

Diagnóstico Diferencial:

O processo mais importante a distinguir da meningite viral é a meningite bacteriana. Uma predominância de neutrófilos no LCR, hipoglicorraquia e bactérias no esfregaço corado pelo Gramou cultura indicam meningite bacteriana. Uma predominância neutrofílica inicial no LCR combinada com uma erupção macular e petequial na meningite enteroviral pode simular meningococcemia com meningite. Bactérias e fungos ocasionais causam meningite com uma pleocitose predominantemente linfocítica semelhante à da maioria das meningites virais. Considerações epidemiológicas e resultados clínicos ajudam a distinguir a meningite por leptospirose, a Borrelía (ou borreliose ou doença) de Lyme e a meningite sifilítica, ao passo que a hipoglicorraquia sugere meningite tuberculosa ou criptocócica.

Meningite por Turbeculose

A tuberculose no SNC pode ser parte de uma doença ativa em outros locais do corpo, ou surgir isoladamente após disseminação a partir de lesões silenciosas (tuberculoma) em outros locais, como os pulmões. Pode envolver as meninges ou o encéfalo.

Morfologia:

O padrão maiss comum é a meningoencefalite difusa; o espaço subaracnoide fica com um exsudato gelatinoso ou fibroso, que envolve de maneira característica a base do encéfalo, obliterando as cisternas e envolvendo os nervos cranianos. Pode ter áreas de inflamação sutis e esbranquiçadas ao mesmo tempo nas leptomeninges.

No microscópio, as áreas envolvidas contêm infiltrados inflamatórios com mistura de linfócitos, macrófagos e plasmócitos. Os casos típicos possuem granulomas bem formados com necrose caseosa e células gigantes. As artérias do espaço subaracnoide podem apresentar endarterite obliterativa e espessamento da íntima. Os organismos são observados com colorações álcool-acidorresistentes.

O processo pode se espalhar para o plexo coroide e para a superfície ependimária, disseminando-se pelo LCR. Em casos de longa duração, há uma aracnoidite adesiva fibrosa e densa, evidente em torno da base do encéfalo, além de ocorrer hidrocefalia.

O envolvimento do SNC tem a forma de massas intraparenquimatosas bem circunscritas, os tuberculomas, que podem estar relacionados à meningite. O tuberculoma varia de tamanho e massa. As lesões possuem um núcleo central de necrose caseosa, circundada por granulomas; a calcificação pode ocorrer nas lesões inativas.

Quadro Clínico:

Apresentam cefaleia, mal-estar, confusão mental e vômitos. O LCR normalmente possui pleocitose mononuclear ou uma mistura de neutrófilos com células mononucleares, concentração elevada de proteínas (muito evidente), e glicose moderadamente reduzida ou normal.

As complicações mais sérias incluem fibrose aracnoide que gera hidrocefalia e a endarterite obliterativa que produz obstrução arterial e infarto ao encéfalo subjacente. Quando envolve o espaço subaracnoide da medula espinal, as raízes dos nervos também podem ser afetadas. Os tuberculomas produzem sintomas típicos de lesões que ocupam o encéfalo devendo ser distinguida de tumores do SNC.

A tuberculose do SNC em pacientes com AIDS é patologicamente similar, porém há menor reação do hospedeiro. Estão em risco de infecção por Mycobacterium avium-intracellulare, comum em infecções generalizadas. Essas lesões contêm lâminas de macrófagos confluentes preenchidas de organismos, com pouco ou nenhum granuloma.

Bibliografia

Medicina Interna de Harrison, 19ª edição.

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Estudante de Medicina e Autora do Blog Resumos Medicina