FISIOLOGIA SENSORIAL.

Todas as vias sensoriais possuem certos elementos em comum. Elas começam com um estímulo, na forma de energia física, que atua em um receptor sensorial. O receptor é um transdutor, o qual converte o estímulo em um sinal intracelular, que normalmente é uma mudança no potencial de membrana. Se o estímulo produz uma mudança que atinge o limiar, são gerados potenciais de ação que são transmitidos de um neurônio sensorial até o sistema nervoso central (SNC), onde os sinais de entrada são integrados.

Os sistemas sensoriais do corpo humano variam amplamente em complexidade. Os sistemas mais simples são neurônios sensoriais únicos com ramificações dendríticas que funcionam como receptores, como os receptores da dor e do prurido. Os sistemas mais complexos são formados por órgãos sensoriais multicelulares, como a orelha e o olho.

RECEPTORES

Os receptores do sistema sensorial variam amplamente em complexidade, desde terminações ramificadas de um neurônio sensorial único até células complexas extremamente organizadas, como os fotorreceptores.

Os receptores mais simples são terminações nervosas não encapsuladas (“livres”).Nos receptores mais complexos, as terminações nervosas são envoltas por cápsulas de tecido conectivo. Os axônios dos receptores simples e complexos podem ser mielinizados ou não mielinizados. 

Os sentidos especiais possuem os receptores mais especializados. Os receptores da olfação são neurônios, mas os outros quatro sentidos especiais utilizam células receptoras não neurais, as quais fazem sinapse com neurônios sensoriais.

RECEPTORES

Para os receptores converterem os diversos estímulos físicos, como a luz ou o calor, em sinais elétricos, o primeiro passo é a transdução, a conversão da energia do estímulo em informação que pode ser processada pelo sistema nervoso. Em muitos receptores, a abertura ou fechamento de canais iônicos converte a energia mecânica, química, térmica ou luminosa diretamente em uma mudança no potencial de membrana.

O estímulo abre ou fecha canais iônicos na membrana do receptor, direta ou indiretamente (via segundo mensageiro). Em muitas situações, a abertura de canais provoca influxo de Na+ ou de outros cátions no receptor, despolarizando a membrana. Em alguns casos, a resposta ao estímulo é uma hiperpolarização, quando o K+ deixa a célula. No caso da visão, o estímulo (luz) fecha canais catiônicos, hiperpolarizando a membrana do receptor.  

papel do sistema nervoso

A informação sensorial de grande parte do corpo entra na medula espinal e segue por vias ascendentes até o encéfalo.

Algumas informações sensoriais vão diretamente para o tronco encefálico pelos nervos cranianos.

As informações sensoriais que iniciam os reflexos viscerais são integradas no tronco encefálico ou na medula espinal, e, em geral, não chegam à percepção consciente. Um exemplo de reflexo visceral inconsciente é o controle da pressão sanguínea por centros do tronco encefálico.

Cada uma das principais divisões do encéfalo processa um ou mais tipos de informação sensorial:

  • O mesencéfalo recebe informação visual;
  • O bulbo recebe aferências geradas a partir dos sons e do gosto;
  • O cerebelo processa principalmente informações do equilíbrio.

Estas vias, junto àquelas que levam informações do sistema somatossensorial, projetam-se ao tálamo, o qual atua como uma estação de retransmissão e processamento antes que a informação seja repassada ao cérebro. 

Apenas a informação olfatória não passa pelo tálamo.

Um aspecto interessante do processamento da informação sensorial pelo SNC é o limiar perceptivo, ou seja, a intensidade do estímulo necessária para que você tome consciência de uma determinada sensação. Os estímulos bombardeiam constantemente seus receptores sensoriais, mas seu cérebro pode filtrar e “desligar” alguns estímulos.

A diminuição da percepção de um estímulo, ou habituação, é obtida por modulação inibidora. A modulação inibidora diminui um estímulo que atingiu o limiar até que o mesmo fique abaixo do limiar perceptivo. Em geral, ela ocorre em neurônios secundários e superiores da via sensorial. 

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OBS: O SNC deve distinguir quatro propriedades de um estímulo: sua natureza, ou modalidade, sua localização, sua intensidade e sua duração: 

  1. Modalidade sensorial:indicada pelos neurônios sensoriais que são ativados e por onde as vias dos neurônios ativados terminam no encéfalo. Cada tipo de receptor é mais sensível a uma modalidade particular de estímulo.Cada modalidade sensorial pode ser subdividida em qualidades. Por exemplo, a visão colorida é dividida em vermelho, azul e verde, de acordo com o comprimento de onda que estimular mais fortemente os diferentes receptores visuais. 
  2. Localização do estímulo: a localização de um estímulo também é codificada de acordo com quais campos receptivos são ativados. As regiões sensoriais do cérebro são muito organizadas em relação aos sinais de entrada, e os sinais provenientes de receptores sensoriais adjacentes são processados em regiões adjacentes do córtex. Esse arranjo preserva a organização topográfica dos receptores da pele, dos olhos ou de outras regiões nos centros de processamento cerebral. 
  3. Intensidade do estímulo: a intensidade do estímulo é codificada em dois tipos de informações: o número de receptores ativados (código populacional) e a frequência de potenciais de ação provenientes desses receptores, chamada de código de frequência.O código populacional para intensidade ocorre pelo fato de o limiar para o estímulo preferencial não ser o mesmo para todos os  receptores. Somente os receptores mais sensíveis (aqueles com limiares mais baixos) respondem a um estímulo de baixa intensidade. Quando a intensidade de um estímulo aumenta, são ativados mais receptores. Assim, o SNC traduz o número de receptores ativados em uma medida de intensidade do estímulo. 
  4. Duração do estímulo: a duração do estímulo é codificada pela duração da série de potenciais de ação no neurônio sensorial. Em geral, um estímulo mais longo gera uma série mais duradoura de potenciais de ação no neurônio sensorial primário. Entretanto, se o estímulo persiste, alguns receptores se adaptam, ou deixam de responder. Os receptores dividem-se em duas classes, dependendo de como eles se adaptam a uma estimulação contínua ou sustentada.
  •   Os receptores tônicos são receptores de adaptação lenta que disparam rapidamente no início da ativação, depois diminuem e mantêm seus disparos enquanto o estímulo estiver presente. Os barorreceptores sensíveis à pressão, os receptores de irritação e alguns receptores táteis e proprioceptores são classificados nessa categoria. 
  • Os receptores fásicos são receptores de adaptação rápida que disparam quando recebem um estímulo, mas param de disparar se a intensidade do estímulo permanecer constante . Os receptores fásicos sinalizam especificamente as alterações em um parâmetro. Assim que o estímulo estiver em uma intensidade estável, os receptores fásicos adaptam-se a esse novo estado e se desligam.

quimiorrecepção: olfação

O sistema olfatório humano consiste de um epitélio olfatório revestindo a cavidade nasal, no qual estão inseridos os neurônios sensoriais primários, chamados de neurônios sensoriais olfatórios.

Os axônios dos neurônios sensoriais olfatórios formam o nervo olfatório, ou nervo craniano I.

O nervo olfatório faz sinapse com neurônios sensoriais secundários no bulbo olfatório, localizado na parte inferior do lobo frontal. Os neurônios secundários e de ordem superior se projetam do bulbo olfatório, através do trato olfatório, para o córtex olfatório.

Os neurônios sensoriais olfatórios possuem um único dendrito, que se estende do corpo celular para a superfície do epitélio olfatório, e um único axônio, que se estende até o bulbo olfatório. Os neurônios sensoriais olfatórios, diferentemente de outros neurônios do corpo, têm vida muito curta, sendo substituídos aproximadamente a cada dois meses.

 A superfície do epitélio olfatório possui os terminais protuberantes dos dendritos dos neurônios sensoriais olfatórios, onde de cada protuberância emergem vários cílios imóveis. Os cílios estão embebidos em uma camada de muco, produzido pelas glândulas olfatórias (glândulas de Bowman) situadas no epitélio e na lâmina própria.

As moléculas odoríferas devem, inicialmente, se dissolver e penetrar no muco antes que possam se ligar a uma proteína receptora olfatória no cílio olfatório. Cada proteína receptora olfatória é sensível a uma faixa limitada de substâncias odoríferas.

Os receptores para substâncias odoríferas são receptores de membrana acoplados à proteína G.

A combinação da maioria das moléculas odoríferas com seus receptores olfatórios ativa uma proteína G especial, a Golf, que, por sua vez, aumenta o AMPc intracelular. O aumento na concentração de AMPc abre canais catiônicos dependentes de AMPc, despolarizando a célula. Se o potencial receptor graduado resultante for suficientemente forte, ele dispara um potencial de ação que percorre o axônio do neurônio sensorial até o bulbo olfatório.

olf 1

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QUIMIORRECEPÇÃO: gustação

Atualmente a gustação é uma combinação de cinco qualidades: doce, azedo (ácido), salgado, amargo e umami, um gosto associado ao aminoácido glutamato e alguns nucleotídeos.

Cada uma das cinco qualidades gustatórias reconhecidas atualmente está associada a um processo fisiológico. O sabor azedo (ácido) é desencadeado pela presença de H+, e o salgado, pela presença de Na+. As concentrações desses dois íons nos líquidos corporais são precisamente reguladas devido à sua importância no equilíbrio do pH e no volume do líquido extracelular. As outras três qualidades gustatórias resultam de moléculas orgânicas. Os sabores doce e umami estão associados a alimentos nutritivos. O sabor amargo é reconhecido pelo corpo como um aviso da possível presença de componentes tóxicos.

Os receptores gustatórios estão localizados primariamente nos botões gustatórios, agrupados na superfície da língua. Um botão gustatório é composto de 50 a 150 células receptoras gustatórias (CRGs), juntamente com células de sustentação e células basais regenerativas.

Os receptores gustatórios também estão espalhados em outras regiões da cavidade oral, como o palato.

Para que uma substância (gustante) seja detectada, ela deve primeiro se dissolver na saliva e no muco da boca. Os ligantes gustatórios dissolvidos interagem com uma proteína localizada na membrana apical (receptora ou canal) da célula receptora gustatória. A interação do ligante gustatório com a proteína de membrana inicia uma cascata de transdução de sinal, que termina com a liberação de um mensageiro químico pela CRG.

Os sinais químicos liberados das células receptoras gustatórias ativam neurônios sensoriais primários (neurônios gustatórios), cujos axônios seguem nos nervos cranianos VII, IX e X para o bulbo, onde fazem sinapse. A informação sensorial, então, vai ao córtex gustatório através do tálamo.

O processamento central da informação sensorial compara a entrada de várias células receptoras gustatórias e interpreta a sensação gustatória com base nas populações neuronais com respostas mais fortes. Os sinais provenientes dos neurônios sensoriais também iniciam respostas comportamentais, como o comportamento alimentar, e respostas antecipatórias, que ativam o sistema digestório.

Os botões gustatórios possuem quatro tipos celulares morfologicamente distintos, denominados I, II e III, mais as células basais. As células tipo I são células de sustentação do tipo glial. As células do tipo II, ou células receptoras, e células do tipo III, ou células pré-sinápticas, são células receptoras gustatórias.

Cada célula receptora gustatória é uma célula epitelial não neural polarizada que está inserida dentro do epitélio, de modo que apenas uma pequena ponta de uma extremidade se estende para a cavidade oral através do poro gustatório. Em um dado botão gustatório, junções de oclusão unem as extremidades apicais de células vizinhas, o que limita o movimento de moléculas entre as células. A membrana apical da CRG é modificada em microvilosidades, as quais aumentam a área de superfície em contato com o ambiente.

Sabores doce, amargo e umami:

  • As células receptoras gustatórias tipo II respondem aos sabores doce, amargo e umami. Essas células expressam vários receptores acoplados à proteína G (RCPG) em suas superfícies apicais. Os sabores doce e umami estão associados aos receptores T1R com diferentes combinações de subunidades. O sabor amargo utiliza cerca de 30 variantes de receptores T2R.
  • As células receptoras do tipo II ativam uma proteína G especial, chamada de gustducina, que, por sua vez, ativa várias vias de transdução de sinal. Algumas dessas vias liberam Ca2+ de estoques intracelulares, ao passo que outras abrem canais catiônicos e permitem a entrada de Ca2+ na célula. Os sinais de cálcio, então, iniciam a liberação de ATP das células do tipo II.

Sabor azedo (ácido):

  • As células pré-sinápticas tipo III respondem ao sabor azedo. Os modelos de estudo dos mecanismos de transdução para o sabor azedo são complicados pelo fato de que aumentando o H+, o sinal para o sabor ácido, o pH também é modificado. Há evidências de que o H+ atua em canais iônicos das células pré-sinápticas, tanto na face intracelular como na extracelular da membrana. A via intracelular permanece incerta. Por fim, a despolarização mediada pelo H+ da célula pré-sináptica resulta na liberação de serotonina por exocitose. A serotonina, por sua vez, excita o neurônio sensorial primário.

Sabor salgado: 

  • As células responsáveis pelo sabor salgado não foram ainda identificadas, mas, algumas evidências sugerem que a recepção do sabor salgado pode envolver as células de sustentação tipo I. Do mesmo modo, a transdução de sinal para o sabor salgado em seres humanos é igualmente obscura, complicada pelo fato de que os camundongos possuem dois diferentes mecanismos, ao passo que os seres humanos parecem ter apenas um. No modelo atual para o sabor salgado, o Na+ entra na célula receptora gustatória através de canal iônico apical, como o canal de Na+ epitelial. A entrada de sódio despolariza a célula, desencadeando uma série de eventos que culminam no disparo de um potencial de ação no neurônio sensorial primário. 

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AUDIÇÃO

A orelha é um órgão sensorial especializado em duas funções distintas: audição e equilíbrio. Ela pode ser dividida em orelhas externa, média e interna, com os elementos neurais alojados nas estruturas da orelha interna e protegidos por elas. O aparelho vestibular da orelha interna é o sensor primário do equilíbrio. O restante da orelha é utilizado para a audição.

A orelha externa é constituída da orelha (aurícula), ou pina, e do meato acústico externo (canal auditivo).

O meato acústico externo (canal auditivo) é fechado em sua extremidade interna por uma camada membranosa fina de tecido, chamada de membrana timpânica, ou tímpano.

A membrana timpânica separa a orelha externa da orelha média, uma cavidade preenchida com ar que se conecta com a faringe através da tuba auditiva (tuba de Eustáquio).

Três pequenos ossos da orelha média conduzem o som do meio externo para a orelha interna: martelo, bigorna e estribo. Os três ossos estão conectados um ao outro por estruturas semelhantes a dobradiças. Uma das extremidades do martelo está fixada à membrana timpânica, e a base do estribo se prende a uma fina membrana, que separa a orelha média da orelha interna.

A orelha interna possui duas estruturas sensoriais principais. O aparelho vestibular, com seus canais semicirculares, é o transdutor sensorial para o nosso sentido do equilíbrio, que será descrito na próxima seção. A cóclea da orelha interna possui os receptores sensoriais da audição. Em uma vista externa, a cóclea é um tubo membranoso que se enrola como uma concha de caracol dentro da cavidade óssea. Dois discos membranosos, a janela do vestíbulo ou janela oval (à qual o estribo se fixa) e a janela da cóclea ou janela redonda, separam o líquido que preenche a cóclea do ar que preenche a orelha média. Os ramos do nervo craniano VIII, o nervo vestibulococlear, vão da orelha interna até o encéfalo.

ORELHA

A audição é a nossa percepção da energia das ondas sonoras, que são ondas de pressão com picos de ar comprimido alternados com vales, onde as moléculas do ar estão mais afastadas.

O som é a interpretação do cérebro da frequência, amplitude e duração das ondas sonoras que chegam até as nossas orelhas. Nosso cérebro traduz a frequência das ondas sonoras (o número de picos das ondas que passam em um determinado ponto a cada segundo) no tom de um som. As ondas de baixa frequência são percebidas como sons baixos ou graves. As ondas de alta frequência criam sons altos ou agudos.

A frequência da onda sonora é medida em ondas por segundo, ou hertz (Hz). A orelha humana pode ouvir sons em uma média de frequência de 20 a 20.000 Hz, sendo a audição mais acurada entre 1.000 a 3.000 Hz.

A altura do som é a nossa interpretação da intensidade do som e é influenciada pela sensibilidade auditiva de cada pessoa. A intensidade de uma onda sonora é uma função da altura da onda, ou amplitude. A intensidade é mensurada em uma escala logarítmica, em unidades conhecidas como decibéis (dB). Cada 10 dB de aumento representa um acréscimo de 10 vezes na intensidade do som.

A audição é um sentido complexo que envolve várias transduções. A energia das ondas sonoras no ar se torna vibrações mecânicas e, depois, ondas no líquido da cóclea. As ondas do líquido abrem canais iônicos nas células pilosas (ciliadas), os receptores da audição. O fluxo de íons para dentro das células gera um sinal elétrico que libera um neurotransmissor (sinal químico), que, por sua vez, dispara potenciais de ação nos neurônios auditivos primários. 

As ondas sonoras que chegam à orelha externa são direcionadas para dentro do meato acústico externo e atingem a membrana timpânica, onde provocam vibrações na membrana (primeira transdução). As vibrações da membrana timpânica são transferidas ao martelo, à bigorna e ao estribo, nesta ordem. A disposição dos três ossos da orelha média conectados cria uma “alavanca” que multiplica a força da vibração (amplificação), de modo que muito pouca energia sonora é perdida devido ao atrito.

Quando o estribo vibra, ele empurra e puxa a fina membrana da janela oval à qual está conectado. As vibrações da janela oval geram ondas nos canais cheios de líquido da cóclea (segunda transdução). À medida que as ondas se movem pela cóclea, elas empurram as membranas flexíveis do ducto coclear, curvando as células ciliadas sensoriais, que estão dentro do ducto. A energia da onda se dissipa de volta para o ar da orelha média na janela redonda.

O movimento do ducto coclear abre ou fecha canais iônicos na membrana das células ciliadas, gerando sinais elétricos (terceira transdução). Esses sinais elétricos alteram a liberação do neurotransmissor (quarta transdução). A ligação do neurotransmissor aos neurônios sensoriais auditivos inicia potenciais de ação (quinta transdução), que transmitem a informação codificada sobre o som pelo ramo coclear do nervo vestibulococlear (nervo craniano VIII) até o encéfalo.

ORELHA 2

A cóclea pode ser vista como três canais paralelos cheios de líquido: a rampa do vestíbulo, ou escala vestibular; o ducto coclear central, ou escala média; e  a rampa do tímpano, ou escala timpânica . As rampas do vestíbulo e do tímpano são contínuas uma à outra e se conectam na extremidade da cóclea por uma pequena abertura, chamada de helicotrema. O ducto coclear é um tubo com extremidade cega, mas que se conecta ao vestíbulo através de uma pequena abertura. 

O líquido presente nas rampas do vestíbulo e do tímpano tem composição iônica similar à do plasma, sendo conhecido como perilinfa. O ducto coclear é preenchido com endolinfa, secretada pelas células epiteliais do ducto. A endolinfa é incomum por sua composição ser mais parecida à do líquido intracelular do que à do extracelular, possuindo alta concentração de K+ e baixa concentração de Na+.

O ducto coclear possui o órgão espiral (órgão de Corti), que contém as células receptoras pilosas (ciliadas) e células de sustentação. O órgão espiral (de Corti) se situa sobre a membrana basilar e está parcialmente coberto pela membrana tectória, ambas tecidos flexíveis que se movem em resposta às ondas que percorrem a rampa do vestíbulo. À medida que as ondas percorrem a cóclea, elas movimentam as membranas basilar e tectória, gerando oscilações para cima e para baixo, que curvam as células pilosas (ciliadas).

As células pilosas, assim como as células receptoras gustatórias, são receptores não neurais. A superfície apical de cada célula ciliada é modificada, formando de 50 a 100 cílios rígidos, chamados de estereocílios, os quais estão dispostos em tamanhos crescentes. Os estereocílios das células pilosas (ciliadas) estão inseridos na membrana tectória acima deles. Se a membrana tectória se movimenta, os cílios abaixo dela também se movem. 

Quando as células pilosas se movem em resposta às ondas sonoras, seus estereocílios se curvam, primeiro em uma direção, depois na outra. Os estereocílios estão ligados uns aos outros por pontes proteicas, chamadas de filamentos de ligação. Os filamentos de ligação atuam como pequenas molas conectadas a comportas (portões) que abrem e fecham canais iônicos na membrana dos estereocílios. Quando as células pilosas e seus estreocílios estão na posição de repouso, cerca de 10% dos canais iônicos estão abertos, e existe uma baixa liberação tônica do neurotransmissor no neurônio sensorial primário.

Quando as ondas provocam uma deflexão na membrana tectória, de modo que os cílios se curvam em direção aos membros mais altos do feixe, os filamentos de ligação abrem um número maior de canais iônicos, e entram cátions (K+ e Ca2+) na célula, que, então, despolariza. Os canais de Ca2+ dependentes de voltagem se abrem, a liberação de neurotransmissor aumenta, e os neurônios sensoriais aumentam sua frequência de disparo. Quando a membrana tectória empurra os estereocílios para longe dos membros mais altos, a tensão nas molas elásticas relaxa, e todos os canais iônicos se fecham. O influxo de cátions diminui, a membrana hiperpolariza, e menos neurotransmissor é liberado, reduzindo os potenciais de ação no neurônio sensorial. O padrão de vibração das ondas que chegam à orelha interna é, então, convertido em um padrão de potenciais de ação que vão para o SNC.

Após a cóclea transformar as ondas sonoras em sinais elétricos, os neurônios sensoriais transferem essa informação para o encéfalo. O nervo coclear (auditivo) é um ramo do nervo craniano VIII, o nervo vestibulococlear . Os neurônios auditivos primários projetam-se da cóclea para os núcleos cocleares do bulbo. Alguns desses neurônios conduzem informações que são processadas na temporização do som, e outros conduzem informações que são processadas como qualidade do som.

Do bulbo, os neurônios sensoriais secundários projetam-se para dois núcleos superiores, um ipsilateral (no mesmo lado do corpo) e outro contralateral (no lado oposto). A divisão dos sinais gerados pelo som em dois tratos ascendentes significa que cada lado do cérebro recebe informação de ambas as orelhas. Esses tratos ascendentes fazem sinapses em núcleos no mesencéfalo e no tálamo, antes de se projetarem para o córtex auditivo. Vias colaterais enviam informações à formação reticular e ao cerebelo.

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visão

A visão é o processo pelo qual a luz refletida pelos objetos em nosso meio externo é traduzida em uma imagem mental. Esse processo pode ser dividido em três etapas:

  1. A luz entra no olho e a lente (cristalino) a focaliza na retina.
  2.  Os fotorreceptores da retina transduzem a energia luminosa em um sinal elétrico. 
  3. As vias neurais da retina para o cérebro processam os sinais elétricos em imagens visuais.

O olho é protegido por uma cavidade óssea, a órbita, formada pelos ossos cranianos da face. As estruturas acessórias associadas ao olho incluem seis músculos extrínsecos, que são músculos esqueléticos que se fixam à superfície externa do bulbo do olho (globo ocular) e controlam os movimentos oculares. Os nervos cranianos III, IV e VI inervam esses músculos.

As pálpebras superiores e inferiores se encontram na superfície anterior do olho, e o aparelho lacrimal, um sistema de glândulas e ductos, mantém um fluxo contínuo de lágrimas que lavam a superfície exposta, de modo que ela permaneça úmida e livre de partículas. A secreção lacrimal é estimulada por neurônios parassimpáticos do nervo craniano VII.

A pupila é uma abertura através da qual a luz pode entrar para o interior do olho. O tamanho da pupila varia com a contração e o relaxamento de músculos lisos da pupila.

O olho é uma esfera oca dividida em dois compartimentos (câmaras) separados por uma lente. A lente (cristalino), suspensa por ligamentos, denominados zônulas ciliares, é um disco transparente que focaliza a luz. A câmara anterior na frente da lente é preenchida com o humor aquoso, um líquido com baixa concentração de proteínas, similar ao plasma, que é secretado pelo epitélio ciliar que sustenta a lente. Atrás da lente, está uma câmara muito maior, a câmara postrema (câmara vítrea), preenchida principalmente pelo humor vítreo, uma matriz clara gelatinosa que ajuda a manter a forma do bulbo do olho. A parede externa do bulbo do olho, a esclera, é constituída de tecido conectivo. 

olho anato

olho 2

A luz entra na superfície anterior do olho através da córnea, um disco de tecido transparente que é a continuação da esclera. Após a luz passar pela abertura da pupila, ela chega à lente, que possui duas superfícies curvadas (convexas). Juntas, a córnea e a lente desviam a direção dos raios de luz que entram, para que eles sejam focalizados na retina, o revestimento do olho sensível à luz que possui os fotorreceptores.

O disco óptico é o local onde os neurônios da via visual formam o nervo óptico (nervo craniano II) e, então, saem do olho. Lateral ao disco óptico está um pequeno ponto mais escurecido, a fóvea. A fóvea e o tecido a sua volta, a mácula lútea, são as regiões da retina com a visão mais acurada. 

Os nervos ópticos vão dos olhos para o quiasma óptico, no encéfalo, onde algumas fibras cruzam para o lado oposto. Após fazer sinapse no corpo geniculado lateral (núcleo geniculado lateral) do tálamo, os neurônios da visão finalizam seu trajeto no córtex visual do lobo occipital. As vias colaterais vão do tálamo para o mesencéfalo, onde fazem sinapse com neurônios eferentes do nervo craniano III, os quais controlam o diâmetro pupilar.

esquema olho

OBS:Na primeira etapa da via visual, a luz proveniente do meio externo entra no olho. Contudo, antes de chegar à retina, a luz sofre desvio de duas maneiras. Primeiro, a quantidade de luz que chega aos fotorreceptores é modulada por modificações no diâmetro da pupila. Segundo, a luz é focalizada por meio de alterações na forma da lente.

sentidos somáticos

Os receptores dos sentidos somáticos são encontrados tanto na pele quanto nas vísceras. A ativação dos receptores desencadeia potenciais de ação no neurônio sensorial primário associado.

Na medula espinal, muitos dos neurônios sensoriais primários fazem sinapse com interneurônios, que funcionam como neurônios sensoriais secundários. A localização da sinapse entre os neurônios primário e secundário varia de acordo com o tipo de receptor.

Os neurônios associados aos receptores da nocicepção, temperatura e tato grosseiro fazem sinapse com seus neurônios secundários assim que entram na medula espinal. Contudo, a maior parte dos neurônios do tato discriminativo, da vibração e da propriocepção possuem axônios muito longos, os quais se projetam para cima, da medula espinal até o bulbo.  

Todos os neurônios sensoriais secundários cruzam a linha média do corpo em algum ponto, de modo que as sensações do lado esquerdo do corpo são processadas pelo hemisfério direito do cérebro, e vice-versa. Os neurônios secundários da nocicepção, temperatura e tato grosseiro cruzam a linha média na medula espinal e se projetam para o encéfalo. Os neurônios do tato discriminativo, da vibração e da propriocepção cruzam a linha média no bulbo.

No tálamo, os neurônios sensoriais secundários fazem sinapse com os neurônios sensoriais terciários, os quais, por sua vez, projetam-se para a região somatossensorial do córtex cerebral. Além disso, muitas vias sensoriais enviam ramos para o cerebelo, o que permite que ele possa usar a informação para coordenar equilíbrio e movimentos.

O córtex somatossensorial é a parte do cérebro que reconhece de onde se originam os tratos sensoriais ascendentes. Cada um dos tratos sensoriais possui uma região correspondente no córtex, seu campo sensorial.

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Os receptores táteis estão entre os receptores mais comuns do corpo. Eles respondem a muitas formas de contato físico, como estiramento, pressão sustentada, vibração (baixa frequência) ou toque leve, vibração (alta frequência) e textura. Eles são encontrados tanto na pele como em regiões mais profundas do corpo.

Os receptores táteis da pele possuem muitas formas. Alguns são terminações nervosas livres, como os que respondem a estímulos nocivos. Outros são mais complexos. Os corpúsculos de Pacini, que respondem à vibração (alta frequência), são um dos maiores receptores do corpo, e muito do que se conhece dos receptores somatossensoriais vem de estudos dessas estruturas. 

Os corpúsculos de Pacini são constituídos de terminações nervosas encapsuladas em camadas de tecido conectivo. Eles são encontrados nas camadas subcutâneas da pele e nos músculos, nas articulações e nos órgãos internos. As camadas concêntricas de tecido conectivo nos corpúsculos criam campos receptivos grandes.

Os corpúsculos de Pacini respondem melhor a vibrações de alta frequência, sendo a energia transferida da cápsula de tecido conectivo para a terminação nervosa, onde abre canais iônicos controlados mecanicamente.

Os corpúsculos de Pacini são receptores fásicos de adaptação rápida, e esta propriedade permite que eles respondam a um estímulo tátil, mas logo o ignore.

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Os receptores de temperatura são terminações nervosas livres que terminam nas camadas subcutâneas da pele. Os receptores para o frio são primariamente sensíveis a temperaturas mais baixas do que a do corpo. Os receptores para o calor são estimulados por temperaturas na faixa que se estende desde a temperatura normal do corpo (37 °C) a até aproximadamente 45 °C. Acima dessa temperatura, os receptores de dor são ativados, gerando uma sensação de calor doloroso.

Existe um número consideravelmente maior de receptores para o frio do que para o calor. Os receptores de temperatura adaptam-se lentamente entre 20 e 40 °C. Sua resposta inicial nos informa que a temperatura está mudando, e sua resposta sustentada nos informa sobre a temperatura do ambiente. Fora da faixa de 20 a 40 °C, em que a probabilidade de dano tecidual é maior, os receptores não se adaptam.

Os termorreceptores utilizam uma família de canais catiônicos, chamada de potencial receptor transitório, ou canais TRP, para iniciar um potencial de ação.


Os nociceptores são neurônios com terminações nervosas livres, os quais respondem a vários estímulos nocivos intensos (químico, mecânico ou térmico) que causam ou têm potencial para causar dano tecidual. Os nociceptores são encontrados na pele, nas articulações, nos músculos, nos ossos e em vários órgãos internos, mas não no sistema nervoso central. A ativação da via nociceptiva inicia respostas adaptativas protetoras.

Os sinais aferentes dos nociceptores são levados ao SNC por dois tipos de fibras sensoriais primárias: fibras A (A-delta) e fibras C. A sensação mais comum transmitida por essas vias é percebida como dor, mas quando a histamina ou algum outro estímulo ativa um subgrupo de fibras C, percebe-se a sensação chamada de prurido.

A dor é uma percepção subjetiva, a interpretação do encéfalo sobre a informação sensorial transmitida pelas vias que se iniciam nos nociceptores. A dor é individual e multidimensional, e pode variar de acordo com o estado emocional da pessoa.

 A dor rápida, descrita como aguda e localizada, é rapidamente transmitida ao SNC por fibras finas mielinizadas do tipo A delta. A dor lenta, descrita como surda e mais difusa, é transmitida por fibras finas não mielinizadas do tipo C. 

Os reflexos nociceptivos protetores iniciam com a ativação de terminações nervosas livres. Os canais iônicos respondem a estímulos químicos, mecânicos e térmicos dando origem a potenciais graduados, os quais disparam potenciais de ação se o estímulo for suficientemente intenso. Muitos desses canais são canais de potencial receptor transitório (TRP), da mesma família de canais dos termorreceptores.

Os agentes químicos que desencadeiam respostas inflamatórias no local da lesão no tecido ativam nociceptores ou os sensibilizam por reduzir seu limiar de ativação. As substâncias químicas locais liberadas em consequência da lesão tecidual incluem K+, histamina e prostaglandinas, liberadas pelas células lesionadas; serotonina liberada por plaquetas ativadas pelo dano tecidual; e o peptídeo substância P, secretado pelos neurônios sensoriais primários. A sensibilidade à dor aumentada no local do dano tecidual é denominada dor inflamatória.

Os neurônios sensoriais primários da nocicepção terminam no corno dorsal da medula espinal. A ativação do nociceptor pode seguir duas vias:  respostas protetoras reflexas, que são integradas na medula espinal (reflexos espinais), e  vias ascendentes para o córtex cerebral, responsáveis pela sensação consciente (dor ou prurido). Os neurônios nociceptivos primários fazem sinapses com interneurônios nas respostas reflexas espinais ou em neurônios secundários que se projetam ao encéfalo.

As respostas nociceptivas integradas na medula espinal iniciam reflexos protetores inconscientes rápidos que, automaticamente, retiram a área estimulada, afastando-a da fonte do estímulo.

As vias ascendentes da nocicepção são similares às outras vias somatossensoriais. Os neurônios sensoriais secundários cruzam a linha média do corpo na medula espinal e ascendem ao tálamo e áreas sensoriais do córtex. As vias também enviam ramos para o sistema límbico e para o hipotálamo. Como resultado, a dor pode ser acompanhada de manifestação emocional (sofrimento) e várias reações neurovegetativas (autônomas), como náuseas, vômitos e sudorese.


A percepção da dor está sujeita à modulação em vários níveis do sistema nervoso. Ela pode ser exacerbada por experiências passadas ou suprimida em situações de emergência, nas quais a sobrevivência depende de se ignorar a lesão. Nessas condições de emergência, vias descendentes que trafegam pelo tálamo inibem neurônios nociceptores na medula espinal. A estimulação destas vias inibidoras é uma das técnicas mais modernas que vêm sendo utilizadas para controlar a dor crônica. 

A dor também pode ser suprimida no corno dorsal da medula espinal, antes que os estímulos cheguem aos tratos espinais ascendentes. Os interneurônios inibidores tonicamente ativos da medula espinal geralmente inibem as vias ascendentes da dor. As fibras C nociceptivas fazem sinapses nesses interneurônios inibidores. Quando ativadas por um estímulo doloroso, as fibras C simultaneamente excitam a via ascendente e bloqueiam a inibição tônica. Essa ação permite que o sinal de dor da fibra C siga para o encéfalo sem impedimento.

Na teoria do portão para a modulação da dor, as fibras A beta que levam informação sensorial de estímulos mecânicos ajudam a bloquear a transmissão da dor. As fibras A beta fazem sinapse com interneurônios inibidores e aumentam a atividade inibidora dos interneurônios. Se estímulos simultâneos de fibras C e A beta chegam ao neurônio inibidor, a resposta integrada é a inibição parcial da via ascendente da dor, de modo que a dor percebida pelo cérebro é menor.

bibliografia

Fisiologia Humana, Dee Unglaub Silverthorn, 7ª edição.

capaaa

Estudante de Medicina e Autora do Blog Resumos Medicina

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