Prevenção da SLT (Hidratação, Monitorização, Agentes Hipouricemiantes)

Ilustração de um rim estilizado com fluxos de fluidos e dissolução de cristais de ácido úrico, representando a prevenção da SLT.
Ilustração de um rim estilizado com fluxos de fluidos e dissolução de cristais de ácido úrico, representando a prevenção da SLT.

A Síndrome de Lise Tumoral (SLT) representa uma emergência oncológica crítica, desencadeada pela rápida destruição de células neoplásicas e a subsequente liberação maciça de seus conteúdos intracelulares na circulação sistêmica. Dada a potencial gravidade das suas complicações metabólicas e risco de lesão renal aguda, a implementação de estratégias profiláticas eficazes é imperativa, especialmente em pacientes com neoplasias de alto risco ou alta carga tumoral submetidos a terapia citotóxica.

Estratégias Fundamentais na Prevenção da Síndrome de Lise Tumoral

O objetivo central da profilaxia da SLT é antecipar e mitigar os distúrbios hidroeletrolíticos característicos – hipercalemia, hiperfosfatemia (frequentemente associada à hipocalcemia secundária pela precipitação de fosfato de cálcio) e hiperuricemia – que podem culminar em lesão renal aguda (LRA). A LRA na SLT pode ser precipitada pela deposição intratubular de cristais de ácido úrico (nefropatia por urato) ou, menos comumente, de cristais de fosfato de cálcio. A abordagem preventiva deve ser iniciada preferencialmente antes do início da quimioterapia ou de outra terapia com potencial citolítico em pacientes estratificados como de risco moderado a alto.

Principais Pilares da Profilaxia da SLT

  • Hidratação Venosa Vigorosa: Considerada a pedra angular da prevenção, a hidratação intravenosa agressiva, tipicamente com soluções cristaloides isotônicas (como soro fisiológico a 0,9%), visa aumentar o volume intravascular, otimizar a perfusão renal e induzir um alto fluxo urinário. Este aumento na diurese promove a excreção renal de potássio, fosfato e ácido úrico, dilui a concentração desses solutos nos túbulos renais, minimizando o risco de precipitação e LRA. A taxa de infusão deve ser ajustada à função renal e ao status volêmico do paciente, com monitorização rigorosa do balanço hídrico para evitar sobrecarga de fluidos. O objetivo é manter um débito urinário elevado (frequentemente citado como >100-150 mL/m²/h ou >2-3 mL/kg/h, embora metas específicas possam variar).
  • Manejo da Hiperuricemia (Agentes Hipouricemiantes): A prevenção e o controle dos níveis de ácido úrico são cruciais devido ao risco de nefropatia por urato.
    • Alopurinol: É um inibidor da xantina oxidase, enzima que catalisa as etapas finais da produção de ácido úrico a partir da degradação de purinas (hipoxantina -> xantina -> ácido úrico). Ao reduzir a *produção* de novo ácido úrico, o alopurinol é primariamente utilizado na *profilaxia* da hiperuricemia em pacientes com risco baixo a intermediário. Sua ação não é imediata sobre os níveis de ácido úrico pré-existentes e não dissolve cristais já formados.
    • Rasburicase: Trata-se de uma urato oxidase recombinante, enzima que converte o ácido úrico já formado em alantoína, um metabólito cinco a dez vezes mais solúvel em urina e facilmente excretado pelos rins. Promove uma redução rápida e eficaz dos níveis séricos de ácido úrico, sendo o agente de escolha para profilaxia em pacientes de alto risco ou para tratamento de hiperuricemia já estabelecida. Sua principal contraindicação é a deficiência de Glicose-6-Fosfato Desidrogenase (G6PD), devido ao risco de hemólise e metemoglobinemia. A escolha entre alopurinol e rasburicase depende da estratificação de risco do paciente, dos níveis basais de ácido úrico e da função renal.
  • Monitorização Laboratorial e Clínica: A vigilância frequente é essencial para a detecção precoce de alterações metabólicas e disfunção renal. Parâmetros chave incluem eletrólitos séricos (potássio, fósforo, cálcio total e ionizado, ácido úrico), função renal (creatinina, ureia), lactato desidrogenase (LDH, como marcador de lise celular) e balanço hídrico/débito urinário. A frequência da monitorização deve ser intensificada em pacientes de alto risco (a cada 4-8 horas inicialmente) e ajustada conforme a evolução clínica e laboratorial, permitindo intervenções terapêuticas imediatas para corrigir distúrbios emergentes.

Hidratação Vigorosa: Detalhes da Implementação na Prevenção da SLT

A administração intravenosa de fluidos, primariamente com solução salina isotônica (NaCl 0,9%), é essencial. O objetivo fundamental é induzir e manter um elevado fluxo urinário, visando um débito frequentemente estabelecido entre 100-150 mL/m²/hora ou 2-3 mL/kg/hora, o que corresponde a aproximadamente 3 litros/m²/dia em muitos protocolos, embora metas como 200-300 mL/hora totais sejam citadas para adultos, dependendo da superfície corporal e condição clínica.

Este aumento do débito urinário alcança múltiplos objetivos cruciais:

  • Otimização da Excreção Renal: Acelera a eliminação de potássio, fosfato e ácido úrico liberados durante a lise celular.
  • Diluição Intratubular: Reduz a concentração de solutos potencialmente nefrotóxicos nos túbulos renais.
  • Prevenção da Cristalização: Diminui significativamente o risco de precipitação de cristais, notadamente de ácido úrico e de fosfato de cálcio, minimizando a probabilidade de nefropatia obstrutiva e lesão renal aguda (LRA).

A implementação da hidratação deve ser iniciada antes da terapia citotóxica em pacientes de risco e mantida durante o período de maior vulnerabilidade à SLT. Contudo, a infusão de grandes volumes exige uma monitorização rigorosa e contínua do balanço hídrico, do débito urinário e dos sinais vitais para prevenir a sobrecarga hídrica (hipervolemia), especialmente em pacientes com comorbidades como insuficiência cardíaca ou disfunção renal prévia. A taxa de infusão deve ser individualizada, ajustando-se com base na função renal basal e evolutiva, no estado de hidratação e na tolerância hemodinâmica do paciente.

O uso de diuréticos, como os de alça (ex: furosemida), não é recomendado como medida profilática de rotina na SLT. Seu uso deve ser reservado para situações específicas de sobrecarga hídrica clinicamente significativa ou em casos de oligúria que persiste apesar de uma hidratação considerada adequada para o estado volêmico do paciente. A administração deve ser cautelosa para evitar a depleção de volume intravascular, hipotensão e a potencial exacerbação de desequilíbrios eletrolíticos.

Monitorização Rigorosa: Detectando e Gerenciando Riscos Precocemente

A vigilância laboratorial e clínica contínua é um componente indispensável na prevenção e no manejo da Síndrome de Lise Tumoral (SLT). A monitorização rigorosa permite a identificação precoce de distúrbios hidroeletrolíticos e da deterioração da função renal, possibilitando a implementação de intervenções terapêuticas direcionadas e em tempo útil, essenciais para minimizar a morbilidade e mortalidade associadas à SLT.

Parâmetros Essenciais de Monitoramento

A avaliação laboratorial seriada é crucial para detectar as alterações metabólicas características da SLT. Os parâmetros fundamentais incluem:

  • Eletrólitos Séricos: Avaliação frequente dos níveis de potássio (K⁺), fósforo (PO₄³⁻), cálcio (Ca²⁺) e ácido úrico.
  • Função Renal: Monitorização dos níveis de ureia e creatinina sérica para avaliar a taxa de filtração glomerular e detectar precocemente a lesão renal aguda (LRA).
  • Marcador de Lise Celular: Níveis de lactato desidrogenase (LDH) podem ser monitorizados para avaliar a magnitude da lise tumoral.
  • Estado Hídrico: Controle rigoroso do balanço hídrico e do débito urinário para assegurar a adequação da hidratação e da excreção renal, evitando tanto a hipovolemia quanto a sobrecarga hídrica.

Implicações Clínicas e Terapêuticas da Monitorização

Os resultados da monitorização orientam diretamente as decisões terapêuticas. A detecção de alterações específicas desencadeia intervenções corretivas imediatas:

  • Hipercalemia: Requer manejo específico, que pode incluir medidas como administração de gluconato de cálcio intravenoso (para estabilização da membrana miocárdica, com cautela na presença de hiperfosfatemia), uso de soluções de glicose e insulina, agonistas beta-adrenérgicos, resinas de troca iônica (como sulfonato de poliestireno de sódio) ou, em casos graves/refratários, hemodiálise.
  • Hiperfosfatemia: Manejada com a administração oral de quelantes de fosfato (ex: carbonato de lantânio, sevelamer) para reduzir a absorção intestinal.
  • Hipocalcemia: A reposição de cálcio (geralmente com gluconato de cálcio) é indicada primariamente em casos sintomáticos, devendo ser realizada com cautela devido ao risco de exacerbar a precipitação de fosfato de cálcio na presença de hiperfosfatemia.
  • Hiperuricemia: O manejo é guiado pelos níveis séricos, com o uso de alopurinol ou rasburicase conforme o risco e a gravidade, ajustando a estratégia conforme a resposta e a função renal.
  • Lesão Renal Aguda: A deterioração da função renal ou desequilíbrios eletrolíticos refratários (como hipercalemia ou hiperfosfatemia graves) podem necessitar de terapia de substituição renal (diálise).

Frequência da Monitorização

A frequência da monitorização laboratorial e do controle hídrico deve ser individualizada, baseando-se no risco estratificado do paciente para SLT e na sua resposta às medidas profiláticas ou terapêuticas. Pacientes classificados como de alto risco, especialmente durante e após a administração de quimioterapia altamente citolítica, exigem avaliações mais frequentes (a cada 4-12 horas, por exemplo). Em muitos destes casos, a internação hospitalar é recomendada para garantir a capacidade de vigilância intensiva e intervenção médica imediata, caso necessário.

Agentes Hipouricemiantes: Estratégias Farmacológicas para Reduzir o Ácido Úrico

O manejo da hiperuricemia é um componente essencial na prevenção da Síndrome de Lise Tumoral (SLT), visando prevenir a nefropatia por urato e a consequente lesão renal aguda. A rápida liberação e degradação de ácidos nucleicos das células tumorais em lise leva a um aumento abrupto do ácido úrico sérico, que pode precipitar nos túbulos renais. Para mitigar este risco, utilizam-se agentes farmacológicos específicos.

Principais Agentes e Mecanismos

  • Alopurinol: Este fármaco atua como inibidor da enzima xantina oxidase (XO), que é fundamental na etapa final da síntese de ácido úrico, catalisando a conversão de hipoxantina em xantina e de xantina em ácido úrico. Ao bloquear esta enzima, o alopurinol efetivamente reduz a produção de novo ácido úrico. Sua principal aplicação é na profilaxia da SLT, apresentando um início de ação mais lento em comparação com a rasburicase. É importante notar que o alopurinol não tem efeito sobre os níveis de ácido úrico já formados e não dissolve cristais de urato preexistentes. O febuxostate é outro inibidor da xantina oxidase que pode ser considerado.
  • Rasburicase: Trata-se de uma urato oxidase recombinante, enzima que catalisa a oxidação do ácido úrico, convertendo-o em alantoína. A alantoína é um composto substancialmente mais hidrossolúvel que o ácido úrico e é facilmente excretada pelos rins. O mecanismo de ação da rasburicase difere fundamentalmente do alopurinol, pois promove a degradação do ácido úrico já existente no plasma. Isso resulta numa redução rápida e significativa dos níveis séricos de urato, sendo a opção preferencial para pacientes classificados como de alto risco para SLT, aqueles com hiperuricemia preexistente ou já estabelecida, ou quando uma redução célere dos níveis de ácido úrico é clinicamente necessária. Uma contraindicação importante para o uso da rasburicase é a deficiência da enzima glicose-6-fosfato desidrogenase (G6PD), devido ao risco elevado de indução de hemólise e meta-hemoglobinemia.

Considerações sobre a Escolha e Estratégias Adicionais

A seleção do agente hipouricemiante mais apropriado deve considerar o risco individual do paciente para SLT, os níveis basais e/ou estabelecidos de ácido úrico, a função renal e a necessidade de controle rápido da uricemia. Enquanto o alopurinol é uma ferramenta profilática estabelecida, a rasburicase oferece uma intervenção terapêutica mais potente para reduzir rapidamente a carga de ácido úrico.

A alcalinização urinária, historicamente proposta com o objetivo de aumentar a solubilidade do ácido úrico nos túbulos renais (alcançando pH urinário > 7) através da administração de bicarbonato de sódio ou acetazolamida, é hoje uma prática controversa. Sua eficácia não está robustamente comprovada e seu uso rotineiro não é recomendado, pois pode aumentar o risco de precipitação de cristais de fosfato de cálcio, além do risco de alcalose metabólica sistêmica. Portanto, a decisão de alcalinizar a urina deve ser cuidadosamente individualizada.

Alopurinol: Inibição da Síntese de Ácido Úrico

O alopurinol é um agente farmacológico central na profilaxia da hiperuricemia associada à Síndrome de Lise Tumoral (SLT). Seu mecanismo de ação primário consiste na inibição da enzima xantina oxidase (XO). Esta enzima desempenha um papel crucial na via catabólica das purinas, catalisando as duas etapas finais que levam à formação do ácido úrico: a oxidação da hipoxantina em xantina e, subsequentemente, da xantina em ácido úrico. Ao bloquear a atividade da xantina oxidase, o alopurinol efetivamente reduz a síntese de novo de ácido úrico, diminuindo a carga úrica que os rins necessitam excretar.

Dada sua ação focada na prevenção da formação de ácido úrico, o alopurinol é predominantemente indicado para a profilaxia em pacientes com risco identificado de desenvolver SLT, sendo sua administração idealmente iniciada antes da terapia citotóxica. Esta abordagem visa prevenir o acúmulo de ácido úrico e, consequentemente, a nefropatia por urato.

No entanto, é fundamental compreender as limitações inerentes ao seu mecanismo de ação:

  • Ausência de Efeito sobre Ácido Úrico Preexistente: O alopurinol não reduz os níveis de ácido úrico já formados e circulantes. Sua ação limita-se a impedir a formação de novas moléculas de ácido úrico.
  • Início de Ação Lento: Comparado a agentes uricolíticos como a rasburicase, o efeito hipouricemiante do alopurinol é mais lento, o que o torna menos adequado para situações de hiperuricemia grave já estabelecida que exigem rápida redução.
  • Ineficácia sobre Cristais Formados: O fármaco não possui capacidade de dissolver cristais de ácido úrico que já possam ter se precipitado nos túbulos renais.

É relevante notar que, embora a alcalinização urinária tenha sido historicamente utilizada para aumentar a solubilidade do ácido úrico, seu uso concomitante com alopurinol ou como estratégia isolada na SLT é controverso e não é recomendado rotineiramente. A alcalinização pode aumentar o risco de precipitação de cristais de fosfato de cálcio e não influencia a solubilidade dos precursores xantina e hipoxantina, que podem acumular-se com a inibição da XO.

Em resumo, o alopurinol é uma ferramenta farmacológica essencial e estabelecida para a prevenção da hiperuricemia na SLT, mas sua aplicabilidade no tratamento agudo de hiperuricemia severa é limitada por seu mecanismo de ação e perfil farmacodinâmico.

Rasburicase: Degradação Rápida do Ácido Úrico

A rasburicase, uma enzima urato oxidase recombinante, atua catalisando a oxidação do ácido úrico preexistente em alantoína. A alantoína é um metabólito consideravelmente mais hidrossolúvel em comparação ao ácido úrico, facilitando sua eficiente excreção pela via renal.

Farmacodinâmica e Vantagem Clínica

A principal vantagem farmacodinâmica da rasburicase reside na sua capacidade de induzir uma redução rápida e expressiva dos níveis séricos de ácido úrico. Esta ação direta sobre o ácido úrico já formado confere-lhe um papel proeminente em situações clínicas onde o controle imediato da hiperuricemia é essencial.

Aplicações Clínicas Estratégicas

Em virtude de sua ação rápida e eficaz, a rasburicase é preferencialmente indicada nos seguintes contextos clínicos:

  • Tratamento da hiperuricemia grave ou já estabelecida no curso da SLT.
  • Profilaxia em pacientes estratificados como de alto risco para o desenvolvimento de SLT.
  • Profilaxia em indivíduos que apresentam hiperuricemia preexistente ao início da terapia citotóxica.
  • Prevenção da Lesão Renal Aguda (LRA) secundária à nefropatia por urato, particularmente em pacientes de alto risco.

Contraindicação Crítica: Deficiência de G6PD

Uma contraindicação absoluta e de extrema importância clínica para a utilização da rasburicase é a presença de deficiência da enzima Glicose-6-Fosfato Desidrogenase (G6PD). A administração deste fármaco em pacientes portadores desta enzimopatia está associada a um risco elevado de desenvolvimento de complicações hematológicas graves, nomeadamente hemólise e metahemoglobinemia. Portanto, a avaliação do status de G6PD é mandatória em populações consideradas de risco antes da instituição da terapia com rasburicase.

Seleção do Agente Hipouricemiante: Alopurinol vs. Rasburicase

A escolha entre alopurinol (ou outros inibidores da xantina oxidase, como o febuxostate) e rasburicase para o manejo da hiperuricemia na Síndrome de Lise Tumoral (SLT) exige uma análise individualizada, considerando a situação clínica específica e os objetivos terapêuticos. Fundamenta-se nos mecanismos de ação distintos, perfis farmacodinâmicos e indicações clínicas previamente abordados para cada agente.

Fatores Determinantes na Escolha Terapêutica

A decisão clínica deve basear-se na ponderação dos seguintes critérios principais:

  • Estratificação de Risco e Objetivo Terapêutico: Para a profilaxia em pacientes com risco baixo a intermediário de desenvolver SLT, o alopurinol (ou febuxostate), que inibe a produção de novo ácido úrico, é frequentemente a escolha inicial. Em contraste, para a profilaxia em pacientes classificados como de alto risco (considerando fatores como elevada carga tumoral, rápida taxa de proliferação celular ou tipos específicos de neoplasias com alta sensibilidade à terapia) ou para o tratamento de hiperuricemia já estabelecida ou grave, a rasburicase é preferível. Sua capacidade de degradar rapidamente o ácido úrico preexistente é crucial nesses cenários.
  • Níveis Basais de Ácido Úrico e Função Renal: A presença de hiperuricemia significativa antes do início da terapia antineoplásica (geralmente níveis > 7.5-8 mg/dL) reforça a indicação de rasburicase. A função renal basal é um fator crítico que influencia tanto a escolha do agente quanto a necessidade de monitorização rigorosa e ajuste de outras medidas, como a hidratação.
  • Necessidade de Controle Rápido: Em situações onde a redução imediata dos níveis de urato é imperativa para prevenir ou tratar a nefropatia por urato e a consequente lesão renal aguda (LRA), a rasburicase é o agente de eleição, dado seu rápido início de ação catalisando a conversão de ácido úrico em alantoína.
  • Disponibilidade e Custo: Fatores práticos, como a disponibilidade do medicamento no serviço e o seu custo, podem intervir na decisão em alguns contextos clínicos, embora a prioridade deva residir na eficácia clínica e na segurança do paciente, conforme o risco individual.

Considerações Adicionais no Manejo Farmacológico da Hiperuricemia

  • Alternativas aos Inibidores da Xantina Oxidase: O febuxostate representa uma alternativa ao alopurinol dentro da classe dos inibidores da xantina oxidase, atuando de forma similar na redução da produção de ácido úrico, podendo ser considerado em cenários clínicos específicos conforme diretrizes institucionais ou características do paciente.
  • Papel da Alcalinização Urinária: A prática da alcalinização urinária (visando manter um pH urinário > 7) para aumentar a solubilidade do ácido úrico é controversa e geralmente não recomendada como medida rotineira na prevenção da SLT. Os potenciais riscos, como a precipitação de cristais de fosfato de cálcio em ambiente alcalino, e a falta de efeito sobre a solubilidade de precursores como xantina e hipoxantina (cujos níveis podem se elevar com inibidores da xantina oxidase), limitam seu benefício. A hidratação vigorosa e o uso criterioso de agentes hipouricemiantes constituem as estratégias primordiais.
  • Segurança da Rasburicase (Deficiência de G6PD): É fundamental reiterar a contraindicação absoluta da rasburicase em pacientes com deficiência da enzima Glicose-6-Fosfato Desidrogenase (G6PD). A administração neste grupo está associada a um risco elevado de hemólise e metaemoglobinemia. Portanto, a triagem para deficiência de G6PD é mandatória em populações de risco antes da consideração terapêutica com rasburicase.

Em suma, a seleção ótima do agente hipouricemiante — alopurinol, febuxostate ou rasburicase — para a prevenção ou tratamento da hiperuricemia na SLT exige a integração da estratificação de risco individual, a avaliação dos níveis de ácido úrico, a função renal, a urgência da intervenção e as considerações de segurança específicas de cada fármaco.

Conclusão: Abordagem Integrada e Proativa na Prevenção da SLT

A prevenção eficaz da Síndrome de Lise Tumoral (SLT) exige uma abordagem integrada, proativa e individualizada, fundamental para mitigar a morbimortalidade associada a esta grave complicação oncológica. A gestão bem-sucedida repousa na aplicação coordenada de estratégias baseadas em evidências, adaptadas ao perfil de risco de cada paciente.

Os pilares desta abordagem preventiva, extensivamente discutidos anteriormente, podem ser sumarizados como:

  • Estratificação de Risco Rigorosa: Identificação precoce de pacientes suscetíveis, baseada nas características do tumor e do paciente, direcionando a intensidade das medidas profiláticas.
  • Manejo Hídrico Otimizado: Implementação de hidratação venosa vigorosa e monitorada para assegurar perfusão renal adequada e promover a excreção de metabólitos tóxicos, minimizando o risco de precipitação cristalina intratubular.
  • Monitorização Laboratorial Vigilante: Acompanhamento seriado dos eletrólitos (potássio, fósforo, cálcio), ácido úrico e função renal para detecção precoce de desvios e permitir intervenção imediata.
  • Controle Farmacológico da Hiperuricemia: Uso criterioso de agentes hipouricemiantes, selecionando entre inibidores da xantina oxidase (como alopurinol ou febuxostate) para reduzir a produção de ácido úrico, ou urato oxidase recombinante (rasburicase) para rápida degradação do ácido úrico existente, especialmente em cenários de alto risco ou hiperuricemia estabelecida. A escolha deve considerar o risco individual, função renal e contraindicações específicas (notavelmente, a deficiência de G6PD para rasburicase).

É relevante notar que, embora historicamente considerada, a alcalinização urinária permanece controversa devido à sua limitada eficácia comprovada e ao potencial risco de precipitação de fosfato de cálcio, não sendo, portanto, uma recomendação rotineira na prevenção atual da SLT. Adicionalmente, em casos selecionados de altíssimo risco, a modulação da intensidade da terapia antineoplásica pode ser considerada como parte da estratégia preventiva global.

Finalmente, uma abordagem preventiva robusta deve contemplar a prontidão para o manejo das complicações que possam surgir apesar das medidas profiláticas. Isto inclui a correção ágil dos distúrbios eletrolíticos (utilizando quelantes de fosfato, terapias específicas para hipercalemia, e administração cautelosa de cálcio) e a disponibilidade de terapia de substituição renal (diálise) para casos de lesão renal aguda grave ou desequilíbrios eletrolíticos refratários.

A aplicação consistente e integrada destas estratégias – estratificação de risco, hidratação, monitorização, farmacoterapia direcionada e prontidão para manejo de complicações – representa o padrão-ouro para a prevenção da SLT, contribuindo decisivamente para a segurança e o sucesso do tratamento oncológico.

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