Fatores físico-químico envolvidos no transporte dos fármacos através das membranas
A absorção, a distribuição, o metabolismo, a excreção e a ação de um fármaco dependem do seu transporte através das membranas celulares.
Na maioria dos casos, o fármaco precisa atravessar as membranas plasmáticas de muitas células até alcançar seu local de ação. Embora os obstáculos ao transporte do fármaco possam se constituir de uma única camada de células (epitélio intestinal), ou de várias camadas de células e proteínas extracelulares associadas (pele), a membrana plasmática representa a barreira comum à distribuição do fármaco.
Os fármacos atravessam a membrana por processos passivos ou por mecanismos envolvendo a participação ativa dos componentes da membrana. No transporte passivo, a molécula do fármaco em geral penetra por meio de difusão seguindo um gradiente de concentração, em virtude da sua solubilidade na camada lipídica dupla.
Essa transferência é diretamente proporcional à amplitude do gradiente de concentração através da membrana, ao coeficiente de partição hidrolipídica do fármaco e à área da membrana exposta ao fármaco. Quanto maior for o coeficiente de partição, maior será a concentração do fármaco na membrana e mais rápida a sua difusão.
Muitos fármacos são ácidos ou bases fracas, presentes em solução sob as formas ionizada e não ionizada.
Em geral, as moléculas não ionizadas são mais lipossolúveis e podem difundir-se facilmente pela membrana celular.
Já as moléculas ionizadas em geral são menos capazes de penetrar na membrana lipídica porque são pouco lipossolúveis e sua transferência depende da permeabilidade da membrana, que é determinada por sua resistência elétrica. Por essa razão, a distribuição transmembrana de um eletrólito fraco é influenciada por seu pKa (é o pH no qual a metade do fármaco (ácido ou base fraca) está em sua forma ionizada) e pelo gradiente de pH através da membrana.
Embora a difusão passiva pela camada lipídica dupla predomine na distribuição da maioria dos fármacos, os mecanismos mediados por carreadores também desempenham papel importante. O transporte ativo caracteriza-se pela necessidade imediata de energia, pelo movimento contra um gradiente eletroquímico, por saturabilidade e seletividade e pela inibição competitiva por compostos cotransportados.
A Na+, K+-ATPase é um exemplo importante do mecanismo de transporte ativo.
Absorção e Biodisponibilidade e vias de Administração dos fármacos
Absorção é a transferência do fármaco do seu local de administração para o compartimento central e a amplitude com que isto ocorre.
Biodisponibilidade é um termo usado para descrever a porcentagem na qual uma dose
A ingestão oral é o método mais comumente usado para administrar os fármacos. Também é o mais seguro, conveniente e econômico. Suas desvantagens são a absorção limitada de alguns fármacos em função de suas características (p. ex., hidrossolubilidade reduzida ou permeabilidade baixa das membranas), vômitos causados pela irritação da mucosa GI, destruição de alguns fármacos pelas enzimas digestivas ou pelo pH gástrico baixo, irregularidades na absorção ou propulsão na presença de alimentos ou outros fármacos e necessidade de contar com a colaboração do paciente.
A injeção parenteral dos fármacos tem algumas vantagens inequívocas em comparação com a administração oral. Em alguns casos, a administração parenteral é essencial para que o fármaco seja liberado em sua forma ativa.
Em geral, a biodisponibilidade é mais rápida, ampla e previsível quando o fármaco for administrado por via injetável. Por essa razão, a dose eficaz pode ser administrada com maior precisão.
Entretanto, a injeção de fármacos tem suas desvantagens; a assepsia deve ser mantida e isto é muito importante quando os fármacos são administrados repetidamente, como ocorre com a infusão intravenosa ou intratecal; as injeções podem ser dolorosas e algumas vezes é difícil para os pacientes aplicarem as injeções neles mesmos, caso seja necessário fazer a automedicação.
A absorção pela mucosa oral tem importância especial para alguns fármacos, apesar do fato de a superfície disponível para a absorção ser pequena. A drenagem venosa da boca dirige-se à veia cava superior e isto provoca um desvio da circulação porta e, deste modo, protege o fármaco do metabolismo rápido causado pela primeira passagem pelos intestinos e pelo fígado.
Nem todos os fármacos penetram facilmente pela pele intacta. A absorção daqueles que o fazem depende da superfície sobre a qual são aplicados e de sua lipossolubilidade, pois a epiderme comporta-se como uma barreira lipídica. Entretanto, a derme é livremente permeável a muitos solutos; por esta razão, a absorção sistêmica dos fármacos ocorre mais facilmente pela pele que sofreu abrasão, queimadura ou desnudamento. Inflamação e outros distúrbios que aumentam o fluxo sanguíneo cutâneo e também ampliam a absorção.
Cerca de 50% do fármaco que é absorvido pelo reto passarão pelo fígado; por esta razão, a amplitude do metabolismo hepático da primeira passagem é menor do que com a preparação oral; além disso, uma enzima metabólica importante desse fármaco (CYP3A4) está presente nos segmentos proximais do intestino, mas não nos segmentos distais. Entretanto, a absorção retal pode ser irregular e incompleta e alguns fármacos podem causar irritação da mucosa retal.
As principais vias de administração parenteral são a intravenosa, subcutânea e intramuscular. A absorção a partir dos tecidos subcutâneos e intramusculares ocorre por difusão simples ao longo do gradiente existente entre o depósito de fármaco e o plasma.
A taxa de absorção é limitada pela área das membranas capilares absortivas e pela solubilidade da substância no líquido intersticial. Canais aquosos relativamente amplos existentes na membrana endotelial explicam a difusão indiscriminada das moléculas, independentemente de sua lipossolubilidade. As moléculas maiores como as pro teínas entram lentamente na circulação por meio dos canais linfáticos.
Os fármacos administrados na circulação sistêmica por qualquer via, com exceção da intra-arterial, estão sujeitos à eliminação potencial na primeira passagem pelos pulmões, antes da distribuição para o restante do corpo. Os pulmões funcionam como reservatório temporário de alguns compostos, em especial dos fármacos de bases fracas e que se encontram predominantemente na forma não iônica no pH sanguíneo. Isto aparentemente deve-se à sua partição lipídica. Os pulmões também atuam como filtros para partículas que possam ser administradas por via intravenosa e constituem uma via de eliminação das substâncias voláteis.
Os fatores limitantes da absorção são anulados pela injeção intravenosa dos fármacos em solução aquosa, porque a biodisponibilidade é completa e rápida. Além disso, a liberação do fármaco é controlada e assegurada com precisão e rapidez, o que não é possível por qualquer outra via.
Existem vantagens e desvantagens no uso dessa via de administração. O paciente pode ter reações indesejáveis porque o fármaco pode atingir rapidamente concentrações altas no plasma e nos tecidos. Existem situações terapêuticas nas quais é aconselhável administrar um fármaco por injeção rápida e outras circunstâncias nas quais se recomenda a administração mais lenta do fármaco, por exemplo, administração de fármacos por “bolsa de infusão” intravenosa.
A administração intravenosa dos fármacos exige monitoração cuidadosa da resposta do paciente. Além disso, depois da injeção do fármaco, geralmente não há como retirá-lo.
A injeção por via subcutânea pode ser realizada apenas com os fármacos que não causam irritação dos tecidos; caso contrário, pode provocar dor intensa, necrose e descamação dos tecidos. Em geral, a taxa de absorção após a injeção subcutânea de um fármaco é suficientemente constante e lenta para produzir um efeito prolongado.
Os fármacos em solução aquosa são absorvidos muito rapidamente após a injeção intramuscular, mas isto depende da taxa de fluxo sanguíneo no local da injeção. A absorção pode ser modulada até certo ponto pelo aquecimento local, pela massagem ou exercício.
Em geral, a taxa de absorção após a injeção de uma preparação aquosa no músculo deltoide ou vasto lateral é mais rápida do que quando a aplicação é no glúteo maior. A taxa de absorção é particularmente mais lenta nas mulheres depois da injeção no glúteo maior. Isso tem sido atribuído à distribuição diferente da gordura subcutânea nos homens e nas mulheres e ao fato de que a gordura é relativamente menos profundida.
Em alguns casos, o fármaco é injetado diretamente em uma artéria para localizar seus efeitos em um tecido ou órgão específico, como, por exemplo, no tratamento dos tumores hepáticos ou cânceres da cabeça e do pescoço. A injeção intra-arterial requer muito cuidado e só deve ser realizada por especialistas. O atenuamento (damping), os efeitos da primeira passagem e a eliminação pulmonar não ocorrem quando os fármacos são administrados por via intra-arterial.
A barreira hematencefálica e o líquido cerebrospinal geralmente impedem ou retardam a entrada dos fármacos no SNC. Por essa razão, quando for necessário produzir efeitos locais rápidos dos fármacos nas meninges ou no eixo, alguns fármacos são injetados diretamente no espaço subaracnoideo medular.
Contanto que não causem irritação, fármacos gasosos e voláteis podem ser inalados e absorvidos pelo epitélio pulmonar e pelas mucosas do trato respiratório. O acesso à circulação é rápido por essa via, tendo em vista que a área pulmonar é grande. Os princípios que controlam a absorção e excreção dos anestésicos e outros gases terapêuticos.
As vantagens dessa via são a absorção quase instantânea do fármaco pela corrente sanguínea; evitar a perda pela primeira passagem hepática; e, no caso de doença pulmonar, a aplicação do fármaco no local de ação desejado.
Aplicação Tópica
Alguns fármacos são aplicados nas mucosas da conjuntiva, nasofaringe, orofaringe, vagina, colo, uretra e bexiga principalmente em decorrência de seus efeitos locais.
A absorção pelas mucosas ocorre rapidamente. Na verdade, em alguns pacientes os anestésicos tópicos assim aplicados por seus efeitos locais podem ser absorvidos tão rapidamente que produzem efeitos tóxicos sistêmicos.
Os fármacos oftálmicos de aplicação tópica são usados principalmente por seus efeitos locais. A absorção sistêmica resultante da drenagem pelo canal nasolacrimal geralmente é indesejável.
Como o fármaco absorvido por drenagem não está sujeito ao metabolismo da primeira passagem pelos intestinos e pelo fígado, podem ocorrer efeitos farmacológicos sistêmicos indesejáveis quando os antagonistas dos receptores beta-adrenérgicos ou corticosteroides são aplicados na forma de colírios oftálmicos. Em geral, os efeitos locais dependem da absorção do fármaco pela córnea; por esta razão, infecção ou traumatismo corneano pode acelerar a absorção.
Bioequivalência
Os produtos farmacológicos são considerados equivalentes farmacêuticos se tiverem os mesmos ingredientes ativos e forem idênticos em potência ou concentração, apresentação e via de administração.
Dois fármacos equivalentes são considerados bioequivalentes quando as taxas e amplitudes da biodisponibilidade do ingrediente ativo em dois produtos não forem significativamente diferentes sob condições experimentais adequadas.
Distribuição
Depois da absorção ou administração sistêmica na corrente sanguínea, o fármaco distribui-se para os líquidos intersticiais e intracelulares. Esse processo depende de alguns fatores fisiológicos e das propriedades físico-químicas específicas de cada fármaco.
Débito cardíaco, fluxo sanguíneo regional, permeabilidade capilar e volume tecidual determinam a taxa de liberação e a quantidade potencial do fármaco distribuído aos tecidos.
Inicialmente, o fígado, os rins, o cérebro e outros órgãos bem irrigados recebem a maior parte do fármaco; a liberação aos músculos, à maioria das vísceras, à pele e aos tecidos adiposos é mais lenta e esta segunda fase de distribuição pode demorar de alguns minutos a várias horas, antes que a concentração do fármaco nos tecidos esteja em equilíbrio com o nível sanguíneo.
A segunda fase também envolve uma fração muito maior da massa corporal (p. ex., músculo) do que a fase inicial e, em geral, é responsável pela maior parte do fármaco distribuído ao espaço extravascular. Com exceção do cérebro e alguns outros órgãos, a difusão do fármaco para o líquido intersticial ocorre de modo rápido, tendo em vista a natureza altamente permeável da membrana endotelial dos capilares.
A distribuição tecidual é determinada pelo fracionamento do fármaco entre o sangue e os tecidos específicos.
A lipossolubilidade e os gradientes de pH transmembrana são determinantes importantes dessa captação para os fármacos que são ácidos ou bases fracas.
O determinante mais importante do fracionamento entre o sangue e os tecidos é a ligação relativa do fármaco às proteínas plasmáticas e macromoléculas teciduais, que limita a concentração do fármaco livre.
Alguns fármacos circulam na corrente sanguínea ligados às proteínas plasmáticas. A albumina é o principal carreador dos fármacos ácidos, enquanto a glicoproteína ácida α1 liga-se aos fármacos básicos.
A ligação inespecífica às outras proteínas plasmáticas geralmente ocorre em uma fração muito menor. Em geral, essa ligação é reversível, embora algumas vezes possam ocorrer ligações covalentes dos fármacos reativos.
A fração de todo o fármaco presente no plasma ligado às proteínas é determinada pela concentração do fármaco, pela afinidade e pelo número dos locais de ligação do fármaco.
Nas concentrações baixas (abaixo da constante de dissociação da ligação às proteínas plasmáticas), a fração ligada depende da concentração dos locais de ligação e da constante de dissociação. Nas concentrações altas (acima da constante de dissociação), a fração ligada depende do número de locais de ligação e da concentração do fármaco.
Para a maioria dos fármacos, a variação terapêutica das concentrações plasmáticas é limitada; assim, a amplitude de ligação e a fração livre são relativamente constantes.
A ligação de um fármaco às proteínas plasmáticas limita sua concentração nos tecidos e em seu local de ação, tendo em vista que apenas a fração livre está em equilíbrio nos dois lados das membranas. Por essa razão, depois que se atingir o equilíbrio de distribuição, a concentração do fármaco ativo (livre) no líquido intracelular é igual à concentração plasmática, exceto quando houver transporte mediado por carreadores.
A ligação de um fármaco às proteínas plasmáticas também limita sua filtração glomerular, porque este processo não altera imediatamente a concentração do fármaco livre no plasma (a água também é filtrada). Contudo, a ligação às proteínas plasmáticas geralmente não limita a secreção tubular renal ou o metabolismo, porque estes processos reduzem a concentração do fármaco livre, que é seguida rapidamente da dissociação do fármaco ligado às proteínas, restabelecendo assim o equilíbrio entre as frações livres e ligadas.
Ligação nos Tecidos
Alguns fármacos acumulam-se nos tecidos em concentrações mais altas do que as detectadas nos líquidos extracelulares e no sangue.
Em geral, a ligação tecidual dos fármacos ocorre com os componentes celulares como proteínas, fosfolipídeos ou proteínas nucleares e geralmente é reversível. Uma fração expressiva do fármaco no corpo pode estar ligada dessa forma e funciona como reservatório, que prolonga a ação do fármaco nesse mesmo tecido ou em locais distantes, depois do transporte pela circulação sanguínea.
Redistribuição
A cessação do efeito farmacológico depois da interrupção do uso de um fármaco em geral ocorre por metabolismo e excreção, mas também pode ser causada pela redistribuição do fármaco do seu local de ação para outros tecidos ou locais.
A redistribuição é um fator importante para a cessação do efeito farmacológico, principalmente quando um composto altamente lipossolúvel que atua no cérebro ou sistema cardiovascular for administrado rapidamente por injeção intravenosa ou inalação.
SNC e líquido cerebrospinal
A distribuição dos fármacos do sangue para o SNC tem características peculiares. Uma das razões para isso é que as células endoteliais dos capilares cerebrais têm junções de oclusão contínuas; por esta razão, a penetração do fármaco no cérebro depende do transporte transcelular, em vez da transferência paracelular.
As características peculiares das células endoteliais dos capilares cerebrais e das células gliais pericapilares constituem a barreira hematencefálica.
A lipossolubilidade das formas não ionizada e livre de um fármaco é um determinante importante da sua captação pelo cérebro; quanto mais lipofílica for a substância, maior a probabilidade de que atravesse a barreira hematencefálica.
Excreção
Os fármacos são eliminados pelo processo de excreção sem qualquer alteração, ou são convertidos em metabólitos. Com exceção dos pulmões, os órgãos excretores eliminam mais eficazmente os compostos polares do que as substâncias altamente lipossolúveis.
O rim é o órgão mais importante para a excreção dos fármacos e seus metabólitos. As substâncias excretadas nas fezes são predominantemente fármacos ingeridos por via oral que não foram absorvidos, ou metabólitos dos fármacos excretados na bile ou secretados diretamente no trato intestinal e que não foram reabsorvidos.
Excreção Renal
A excreção dos fármacos e metabólitos na urina inclui três processos independentes: filtração glomerular, secreção tubular ativa e reabsorção tubular passiva.
A quantidade do fármaco que chega ao lúmen tubular por filtração depende da taxa de filtração glomerular e da extensão da ligação plasmática do fármaco; apenas a fração livre é filtrada. No túbulo renal proximal, a secreção tubular ativa mediada por carreadores também pode aumentar a quantidade do fármaco presente no líquido tubular.
Os transportadores de membrana, que estão localizados predominantemente no túbulo renal distal, também são responsáveis por toda a reabsorção ativa do fármaco do lúmen tubular de volta à circulação sistêmica; entretanto, a maior parte dessa reabsorção ocorre por difusão não aniônica.
Nos túbulos proximais e distais, as formas não ionizadas dos 27 ácidos e das bases fracos sofrem reabsorção passiva global.
Quando a urina tubular está mais alcalina, os ácidos fracos estão em grande parte ionizados e, desta forma, são excretados mais rapidamente e em quantidades maio res. Quando a urina tubular estiver mais ácida, a fração do fármaco ionizado é reduzida, o mesmo acontece com sua excreção.
No tratamento das intoxicações farmacológicas, a excreção de alguns fármacos pode ser acelerada pela alcalinização ou acidificação apropriada da urina. Se a alteração do pH urinário resulta em uma modificação significativa na eliminação do fármaco, depende da extensão e persistência da alteração do pH e da contribuição da reabsorção passiva dependente de pH para a eliminação total do fármaco.
O efeito é mais intenso para os ácidos e as bases fracas com valores de pKa na faixa do pH urinário (5,0-8,0). Contudo, a alcalinização da urina pode aumentar 4-6 vezes a excreção dos ácidos relativamente fortes, como é o caso dos salicilatos, quando o pH urinário é aumentado de 6,4 para 8,0 e a fração do fármaco não ionizado é reduzida de 1% para 0,04%.
Excreção Biliar e Fecal
Também existem transportadores na membrana canalicular do hepatócito, que secretam ativamente fármacos e metabólitos na bile.
Os fármacos e metabólitos presentes na bile são liberados no trato GI durante o processo digestivo. Como os transportadores secretores também estão expressos na membrana apical dos enterócitos, pode haver secreção direta dos fármacos e metabólitos da circulação sistêmica para o lúmen intestinal.
Em seguida, os fármacos e metabólitos podem ser reabsorvidos do intestino de volta ao corpo que, no caso dos metabólitos conjugados como os glicuronídeos, podem necessitar da hidrólise enzimática pela flora intestinal. Se for extensa, essa reciclagem êntero-hepática pode prolongar significativamente a permanência de um fármaco (ou de uma toxina) e seus efeitos no organismo, antes da eliminação por outras vias. Por essa razão, alguns fármacos podem ser administrados por via oral para se ligarem às substâncias excretadas na bile.
Outras Vias de Excreção
A excreção dos fármacos pelo suor, pela saliva e lágrimas é quantitativamente desprezível. A eliminação por essas vias depende principalmente da difusão da forma lipossolúvel não ionizada dos fármacos pelas células epiteliais das glândulas e depende do pH.
Os fármacos excretados na saliva entram na boca, de onde geralmente são deglutidos. A concentração de alguns fármacos na saliva é proporcional ao nível plasmático. Por essa razão, a saliva pode ser um líquido biológico útil para determinar as concentrações dos fármacos, quando for difícil ou inconveniente obter uma amostra de sangue.
Metabolismo
As características lipofílicas dos fármacos que promovem sua passagem pelas membranas biológicas e o acesso subsequente aos locais de ação dificultam sua excreção do organismo.
O metabolismo dos fármacos e outros compostos xenobióticos em metabólitos mais hidrofílicos é essencial à sua eliminação do organismo, bem como à cessação das suas atividades biológica e farmacológica.
Em geral, as reações do metabolismo geram metabólitos inativos mais polares, facilmente excretados pelo organismo. Entretanto, em alguns casos, o organismo produz metabólitos com atividade biológica potente ou propriedades tóxicas.
Alguns dos sistemas enzimáticos que transformam fármacos em metabólitos inativos também geram metabólitos biologicamente ativos dos compostos endógenos.
O metabolismo dos fármacos é classificado em dois tipos: reações de funcionalização da fase I (catabólico) e reações de biossíntese da fase II (conjugação/anabólico).
As reações da fase I introduzem ou expõem um grupo funcional do composto original, como ocorre nas reações de hidrólise. Em geral, as reações da fase I resultam na perda da atividade farmacológica, embora existam exemplos de conservação ou ampliação desta atividade.
Os pró-fármacos são compostos farmacologicamente inativos produzidos a fim de maximizar a quantidade da substância ativa que chega ao local de ação (absorção). Os pró-fármacos inativos são convertidos em metabólitos biologicamente ativos, em geral por hidrólise de uma ligação éster ou amida.
As reações de conjugação da fase II resultam na formação de uma ligação covalente entre um grupo funcional do composto original ou do metabólito da fase I e o ácido glicurônico, sulfato, glutationa, aminoácidos ou acetato formados pelos processos endógenos. Em geral, esses conjugados altamente polares são inativos e excretados rapidamente na urina e nas fezes.
Os sistemas enzimáticos envolvidos no metabolismo dos fármacos estão localizados principalmente no fígado, embora todos os tecidos examinados tenham alguma atividade metabólica. Outros órgãos com função metabólica significativa são o trato GI, os rins e os pulmões.
Depois da administração oral de um fármaco, uma porcentagem significativa da dose pode ser inativada metabolicamente no epitélio intestinal ou fígado, antes que o fármaco chegue à circulação sistêmica.
O assim chamado metabolismo da primeira passagem limita de modo significativo a disponibilidade oral dos fármacos amplamente metabolizados. Em determinada célula, a maior parte da atividade metabólica dos fármacos é encontrada no retículo endoplasmático liso e no citosol, embora o metabolismo dos fármacos também possa ocorrer nas mitocôndrias, no invólucro nuclear e na membrana plasmática.
Os sistemas enzimáticos envolvidos nas reações da fase I estão localizados principalmente no retículo endoplasmático, enquanto os sistemas enzimáticos de conjugação da fase II são predominantemente citosólicos. Em geral, os fármacos metabolizados por uma reação da fase I no retículo endoplasmático são conjugados sequencialmente nesta mesma organela ou na fração citosólica da mesma célula.
Essas reações do metabolismo são realizadas pelas CYPs (isoformas do citocromo P450) e por várias transferases.
As enzimas metabolizadoras dos fármacos eram agrupadas como as que realizam as reações da fase 1 (que inclui oxidação, redução ou reações hidrolíticas) e as reações da fase 2 (pelas quais as enzimas catalisam a conjugação do substrato [produto da fase 1] com uma segunda molécula).
As enzimas da fase 1 possibilitam a introdução dos grupos funcionais como –OH, –COOH, –SH, –O– ou NH2.
O acréscimo dos grupos funcionais aumenta muito pouco a hidrossolubilidade do fármaco, mas pode alterar profundamente suas propriedades biológicas.
As reações efetuadas pelas enzimas da fase 1 geralmente resultam na inativação do fármaco. Entretanto, em alguns casos, o metabolismo (geralmente por hidrólise de uma ligação éster ou amida) resulta na bioativação do fármaco.
Os fármacos inativos que são metabolizados a um composto ativo são conhecidos como pró-fármacos.
As enzimas da fase 2 facilitam a eliminação dos fármacos
e a inativação dos metabólitos eletrofílicos potencialmente óxicos produzidos pela oxidação.
Enquanto muitas das reações da fase 1 levam à inativação biológica do fármaco, as reações da fase 2 produzem metabólitos mais hidrossolúveis e esta alteração facilita a eliminação do fármaco pelos tecidos, geralmente por transportadores de efluxo.
As reações de oxidação da fase 1 são realizadas pelas enzimas do CYP, pelas monoxigenases que contêm flavina (FMO) e pelo epóxido hidroxilases (EH). Os CYP e as FMO são formados por superfamílias de enzimas.
As enzimas da fase 2 incluem várias superfamílias de enzimas conjugadoras. Em geral, essas reações de conjugação dependem de que o substrato tenha átomos de oxigênio (grupos hidroxila ou epóxido), nitrogênio e enxofre, que funcionam como locais aceptores para uma molécula hidrofílica.
A oxidação pelas enzimas da fase 1 acrescenta ou expõe um grupo funcional, possibilitando que os produtos metabólitos dessa fase funcionem como substratos para as enzimas conjugadoras ou sintéticas da fase 2.
Metabolismo de Xenobióticos
Os seres humanos entram em contato com milhares de substâncias químicas estranhas, remédios ou xenobióticos (substâncias estranhas ao organismo) por meio da exposição intencional ou acidental aos contaminantes ambientais bem como através da alimentação. Felizmente, os seres humanos desenvolveram mecanismos para eliminar rapidamente os xenobióticos, de modo que estes não se acumulem nos tecidos e causem danos.
Os fármacos são considerados xenobióticos e muitos são amplamente metabolizados pelos seres humanos.
Embora seja benéfica na maioria dos casos, essa capacidade de metabolizar xenobióticos torna o desenvolvimento de fármacos muito demorado e dispendioso, em grande parte devido: Às variações individuais na capacidade dos seres humanos de metabolizarem os fármacos; às interações medicamentosas; à diferenças entre as espécies no que se refere à expressão das enzimas que metabolizam os fármacos e, deste modo, limitam o uso dos modelos animais para testar fármacos de modo a prever seus efeitos nos seres humanos.
Os xenobióticos aos quais os seres humanos estão expostos provêm de fontes como poluição ambiental, aditivos alimentares, produtos cosméticos, agroquímicos, alimentos processados e fármacos. Em geral, a maioria dos xenobióticos é de compostos lipofílicos que, se não fossem metabolizados, poderiam acumular-se no organismo e causar toxicidade.
Com pouquíssimas exceções, os xenobióticos estão sujeitos a um ou vários processos metabólicos que constituem a oxidação da fase 1 e a conjugação da fase 2.
As enzimas metabolizadoras dos xenobióticos convertem os fármacos e outros xenobióticos em derivados mais hidrofílicos e, consequentemente, podem ser facilmente eliminados por excreção nos compartimentos aquosos dos tecidos.
Embora as enzimas metabolizadoras dos xenobióticos sejam responsáveis por facilitar a eliminação das substâncias químicas do organismo, paradoxalmente essas mesmas enzimas também podem converter alguns compostos químicos em metabólitos tóxicos e carcinogênicos altamente reativos. Isso ocorre quando se forma um intermediário instável, que apresenta reatividade frente a outros componentes celulares.
As substâncias químicas que podem ser convertidas pelo metabolismo xenobiótico em derivados capazes de causar câncer são conhecidas como carcinógenos. Dependendo da estrutura do substrato químico, as enzimas metabolizadoras dos xenobióticos podem produzir metabólitos eletrofílicos que reagem com macromoléculas celulares nucleofílicas, entre as quais estão o DNA, o RNA e as proteínas. Isso pode causar morte celular e toxicidade ao organismo.
Se um fármaco for metabolizado muito rapidamente, a perda da sua eficácia terapêutica será rápida. Isso pode ocorrer se enzimas específicas envolvidas no metabolismo estiverem naturalmente hiperativas, ou forem induzidas por fatores dietéticos ou ambientais. Se um fármaco for metabolizado muito lentamente, pode acumular-se na corrente sanguínea; por esta razão, o parâmetro farmacocinético conhecido como AUC (área sob a curva de concentração plasmática-tempo) é aumentado e a depuração plasmática do fármaco é reduzida.
Esse aumento da AUC pode levar à estimulação ou à inibição excessiva de alguns receptores-alvos, ou à ligação indesejável a outras macromoléculas celulares. Em geral, o aumento da AUC ocorre quando as enzimas metabolizadoras específicas dos xenobióticos estão inibidas, o que pode ocorrer quando um indivíduo estiver usando uma combinação de agentes terapêuticos diferentes e um desses fármacos tiver como alvo a enzima envolvida no metabolismo dos fármacos.
A maioria das enzimas metabolizadoras dos xenobióticos apresenta diferenças polimórfi cas em sua expressão, que resultam das alterações hereditárias na estrutura dos genes.
Os xenobióticos podem influenciar a extensão do metabolismo dos fármacos, por meio da ativação da transcrição e da indução da expressão dos genes que codificam as enzimas metabolizadoras.
Desse modo, um composto estranho pode induzir seu próprio metabolismo, como ocorre com alguns fármacos. Uma consequência potencial disso é a redução da concentração plasmática do fármaco ao longo do tratamento, levando à perda da eficácia, à medida que o metabolismo autoinduzido do fármaco ultrapassa a taxa à qual o novo composto entra no organismo.
Um receptor específico, quando ativado por um ligando, pode induzir a transcrição de um conjunto de genes-alvo. Entre esses genes estão algumas enzimas do CYP e transportadores dos fármacos.
Dessa forma, qualquer fármaco que seja um ligando para determinado receptor que induz as enzimas do CYP e os transportadores pode causar interações farmacológicas.
Locais de Metabolismo dos Fármacos
As enzimas metabolizadoras dos xenobióticos estão presentes em muitos tecidos do corpo, embora os níveis mais altos sejam encontrados nos tecidos do trato GI (fígado e intestinos delgado e grosso).
Os fármacos administrados por via oral, absorvidos pelo intestino e levados ao fígado podem ser amplamente metabolizados. O fígado é considerado a principal “usina de depuração metabólica” dos compostos químicos endógenos (p. ex., colesterol, hormônios esteroides, ácidos graxos e proteínas) e xenobióticos.
O intestino delgado desempenha papel crucial no metabolismo dos fármacos, porque os fármacos administrados por via oral são absorvidos no intestino e levados ao fígado pela veia porta.
As enzimas metabolizadoras dos xenobióticos presentes nas células epiteliais do trato GI são responsáveis pelo processamento metabólico inicial de muitos fármacos administrados por via oral. Esse deve ser considerado o local inicial do metabolismo do fármaco.
Em seguida, o fármaco absorvido entra na circulação porta para sua primeira passagem pelo fígado, onde o metabolismo pode ser signifi cativo. Embora uma parte do fármaco ativo escape desse metabolismo no trato GI e no fígado, as passagens subsequentes pelo fígado resultam em mais metabolismo do composto original, até que este tenha sido totalmente eliminado.
Desse modo, os fármacos que não são amplamente metabolizados permanecem no organismo por mais tempo e seus perfis farmacocinéticos mostram meias-vidas de eliminação muito mais longas do que os compostos que são rapidamente metabolizados.
Outros órgãos que contêm quantidades signifi cativas de enzimas metabolizadoras dos xenobióticos são tecidos da mucosa nasal e dos pulmões, que desempenham funções importantes no metabolismo dos fármacos administrados por aerossóis.
Dentro da célula, as enzimas metabolizadoras dos xenobióticos são encontradas nas membranas intracelulares e no citosol.
As enzimas da fase 1 como CYP, FMO e EH e algumas enzimas de conjugação da fase 2 (principalmente as UGT) estão presentes no retículo endoplasmático da célula.
Depois da oxidação, os fármacos podem ser conjugados diretamente pelas UGTs (no lúmnen do retículo endoplasmático) ou pelas transferases citosólicas como as GST e SULT. Em seguida, os metabólitos podem ser transportados para fora da célula através da membrana plasmática, quando então são transferidos para a corrente sanguínea.
Os hepatócitos, que constituem > 90% das células hepáticas, são responsáveis pelo metabolismo da 127 maioria dos fármacos e podem produzir substratos conjugados que também podem ser transportados pela membrana dos canalículos biliares para a bile, a partir da qual são eliminados no intestino.
Reações de Fase 1
As enzimas do CYP constituem uma superfamília de enzimas, das quais todas contêm uma molécula de heme ligada não covalentemente à cadeia polipeptídica.
Muitas outras enzimas que usam O2 como substrato para suas reações também contêm grupos heme. O heme é a unidade de ligação do oxigênio presente na hemoglobina, onde participa da ligação e do transporte do oxigênio molecular dos pulmões para outros tecidos.
O heme contém um átomo de ferro em uma estrutura de carboidrato, cuja função é ligar o oxigênio aos locais ativos do CYP como parte do ciclo catalítico dessas enzimas.
As enzimas do CYP usam o O2 e o H+ derivado do fosfato dinucleotídeo de adenina e nicotinamida reduzido por cofator (NADPH) para realizar a oxidação dos substratos. O H+ é fornecido pela enzima NADHP-citocromo P450 oxidorredutase.
O H+ é fornecido pela enzima NADHP-citocromo P450 oxidorredutase. O metabolismo de um substrato pelo CYP consome uma molécula de oxigênio molecular e produz um substrato oxidado e uma molécula de água como subprodutos. Entretanto, com a maioria das enzimas do CYP, dependendo do tipo de substrato, a reação é “desproporcional”, consumindo mais O2 do que o substrato metabolizado e formando o que se conhece como oxigênio ativado ou O2.
Entre as diversas reações efetuadas pelas enzimas do CYP dos mamíferos estão a N-desalquilação, a O-desalquilação, a hidroxilação aromática, a N-oxidação, a S-oxidação, a desaminação e a desalogenação.
As enzimas do CYP envolvidas no metabolismo dos xenobióticos têm capacidade de metabolizar diversas substâncias químicas. Isso é atribuído às suas múltiplas formas e à capacidade de uma única enzima do CYP metabolizar muitos compostos estruturalmente diferentes.
Também há superposição significativa das especificidades por substratos dos CYPs; um único composto também pode ser metabolizado por diversas enzimas do CYP, embora a taxas diferentes.
Além disso, as enzimas do CYP podem metabolizar o mesmo composto em diferentes posições da molécula.
Essa propriedade, decorrente dos locais de ligação amplos e flexíveis das enzimas do CYP, sacrifica as taxas de transição metabólicas; as enzimas do CYP metabolizam substratos em uma fração da taxa metabólica das enzimas mais típicas envolvidas no metabolismo intermediário e na transferência de elétrons mitocondriais. Por essa razão, os fármacos geralmente têm meias-vidas na faixa de 3 e 30 h, enquanto os compostos endógenos (p. ex., dopamina e insulina) têm meias-vidas na faixa de segundos ou minutos.
Ainda que as enzimas do CYP tenham taxas catalíticas baixas, suas atividades são sufi cientes para metabolizar os fármacos administrados em concentrações altas no organismo. Essa característica incomum de superposição ampla das especificidades pelos substratos das enzimas do CYP é um dos fatores responsáveis pelo predomínio das interações entre os fármacos.
Quando dois fármacos administrados simultaneamente são metabolizados pela mesma enzima do CYP, eles competem pela ligação ao local ativo da enzima. Isso pode levar à inibição do metabolismo de um ou dos dois fármacos, resultando em níveis plasmáticos altos. Se os fármacos tiverem índices terapêuticos restritos, os níveis séricos altos podem causar efeitos tóxicos indesejáveis.
As enzimas do CYP são denominadas pela raiz CYP seguida de um número para designar a família, uma letra para descrever a subfamília e outro número para assinalar o tipo de CYP.
Embora várias famílias de CYP estejam envolvidas na síntese dos hormônios esteroides e dos ácidos biliares e também no metabolismo do ácido retinoico e dos ácidos graxos (inclusive prostaglandinas e eicosanoides), um pequeno número de CYPs pertencentes às famílias 1 e 3 está envolvido predominantemente no metabolismo dos xenobióticos.
Como a mesma enzima do CYP pode metabolizar inúmeros compostos estruturalmente diferentes, essas enzimas podem, em conjunto, metabolizar inúmeras substâncias químicas encontradas na dieta e no ambiente e administradas como fármacos.
O fígado contém as maio res quantidades de enzimas do CYP metabolizadoras de xenobióticos, assegurando dessa forma a efi ciência do metabolismo de primeira passagem dos fármacos. As enzimas do CYP também estão expressas em todo o trato GI e em quantidades menores nos pulmões, nos rins e até mesmo no SNC.
A expressão das diferentes enzimas do CYP pode diferir bastante, em consequência de exposições ambientais e hábitos alimentares aos indutores, ou devido às variações interindividuais resultantes das diferenças polimórficas hereditárias na estrutura dos genes; assim, os padrões de expressão específicos de cada tecido afetam o metabolismo e a depuração globais dos fármacos.
As enzimas do CYP mais ativas no metabolismo dos fármacos pertencem às subfamílias CYP2C, CYP2D e CYP3A. A CYP3A4 é a enzima expressa mais abundantemente e está envolvida no metabolismo de mais de 50% dos fármacos usados na prática clínica.
O metabolismo dos fármacos também pode ser influenciado pela dieta. Os inibidores e os indutores das enzimas do CYP são encontrados comumente nos alimentos e, em alguns casos, podem influenciar a toxicidade e a eficácia de um fármaco.
As FMOs constituem uma outra superfamília de enzimas da fase 1 que estão envolvidas no metabolismo dos fármacos. Assim como ocorre com as enzimas do CYP, as FMOs estão expressas em níveis altos no fígado e ligadas ao retículo endoplasmático, local que favorece a interação e o metabolismo dos substratos farmacológicos hidrofóbicos.
Existem seis famílias de FMOs, das quais a FMO3 é a mais abundante no fígado. Essa enzima é capaz de metabolizar a nicotina e também os antagonistas dos receptores H2 (cimetidina e ranitidina), os antipsicóticos (clozapina) e os antieméticos (itoprida).
As FMOs parecem contribuir pouco para o metabolismo dos fármacos e quase sempre produzem metabólitos benignos. Além disso, as FMOs não são induzidas por quaisquer receptores xenobióticos, ou não são inibidas facilmente; desse modo, ao contrário das enzimas dos CYPs, não se deve esperar que as FMOs estejam envolvidas nas interações medicamentosas.
Reações de Fase 2
Existem muitas enzimas de conjugação da fase 2, das quais todas são consideradas de natureza sintética, pois resultam na formação de um metabólito com peso molecular maior.
As reações da fase 2 também normalmente bloqueiam a atividade biológica dos fármacos, embora os compostos como a morfina e o minoxidil e os conjugados glicuronídicos e sulfatados, respectivamente, sejam farmacologicamente mais ativos que os compostos originais.
Duas reações da fase 2, glicuronidação e sulfatação, resultam na formação de metabólitos com coeficientes de partição hidrolipídica significativamente mais altos, geram hidrofilicidade e facilitam a acumulação dos metabólitos nos compartimentos aquosos das células e do corpo.
Uma característica das reações da fase 2 é a dependência que as reações catalíticas mostram por cofatores (ou, mais propriamente, cossubstratos) como UDP-ácido glicurônico (UDP-GA) e 3′-fosfoadenosina-5′-fosfossulfato (PAPS), nos casos da UDP-glicuronosiltransferases (UGTs) e sulfotransferases (SULTs), respectivamente, que reagem com o grupos funcionais disponíveis nos substratos.
Os grupos funcionais reativos são gerados frequentemente pelas enzimas do CYP da fase 1, embora existam muitos fármacos (p. ex., paracetamol) com os quais a glicuronidação e/ou a sulfatação ocorre diretamente sem metabolismo oxidativo prévio.
Todas as reações da fase 2 ocorrem no citosol da célula, com exceção da glicuronidação, que acontece na superfície intraluminar do retículo endoplasmático.
As taxas catalíticas das reações da fase 2 são significativamente maio res que as taxas das enzimas do CYP. Desse modo, se for desenvolvido um fármaco para oxidação por enzimas da fase 1 (CYP), seguida da conjugação por uma enzima da fase 2, geralmente a taxa de eliminação dependerá da reação inicial de oxidação (fase 1).
Como a taxa de conjugação é mais rápida e o processo resulta em aumento da hidrofilicidade do fármaco, geralmente se considera que as reações da fase 2 asseguram a eliminação e detoxificação eficazes da maioria dos fármacos.
Entre as reações da fase 2 mais importantes para o metabolismo dos fármacos encontra-se a reação catalisada pelas UDP-glicuroniltransferases (UGT).
Essas enzimas catalisam a transferência do ácido glicurônico do cofator UDP-ácido glicurônico para um substrato para formar ácidos β-Dglicopiranosidurônicos (glicuronídeos), que são metabólitos sensíveis à clivagem pela β-glicuronidase.
As sulfotransferases (SULT) são citosólicas e conjugam o sulfato derivado do 3′-fosfoadenosina-5′- fosfossulfato (PAPS) para os grupos hidroxila e, menos comumente, aos grupos amina dos compostos aromáticos e alifáticos. Assim como todas as enzimas metabolizadoras dos xenobióticos, as SULTs metabolizam grande variedade de substratos endógenos e exógenos.
As glutationa-S-transferases (GST) catalisam a transferência da glutationa aos eletrófilos reativos, função que serve para proteger as macromoléculas celulares da interação com eletrófilos que contenham heteroátomos eletrofílicos (–O, –N e –S) e, por sua vez, proteger o ambiente celular contra danos.
As N-acetiltransferases (NATs) citosólicas são responsáveis pelo metabolismo dos fármacos e agentes ambientais que contêm uma amina aromática ou um grupo hidrazina. O acréscimo do grupo acetila proveniente do cofator acetilcoenzima A geralmente resulta em um metabólito que é menos hidrossolúvel, porque a amina potencialmente ionizável é neutralizada pelo acréscimo covalente do grupo acetila. As NATs estão entre as mais polimórficas de todas as enzimas humanas metabolizadoras de fármacos e xenobióticos.
Bibliografia
As bases Farmacológicas da Terapêutica de Goodman & Gilman, 13ª edição.
Estudante de Medicina e Autora do Blog Resumos Medicina
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