A esofagite infecciosa é uma doença observada, na maior parte dos casos, nos pacientes com comprometimento do sistema imunológico. Ocorre principalmente nos pacientes infectados pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) ou submetidos à quimioterapia e/ou uso de imunossupressores, particularmente no tratamento das doenças malignas e transplante de órgãos, e também nos pacientes em uso de antibioticoterapia prolongada e corticoterapia. Os sintomas mais comuns da doença esofágica são odinofagia, disfagia, dor torácica retroesternal, náusea, vômito e pode ocorrer febre. Os sintomas podem levar ao agravamento do estado nutricional e aumento da morbimortalidade das doenças associadas.
A esofagite infecciosa, em condições especiais, pode manifestar-se por complicações graves, como hemorragia digestiva, estenose, fistulização ou perfuração. Entre os principais patógenos estão: Candida albicans, herpes- -vírus e citomegalovírus. A endoscopia digestiva alta (EDA) é considerada padrão- -ouro para o diagnóstico das lesões esofágicas. Trata-se do método mais sensível e específico, pois permite avaliação da mucosa e obtenção de material para análise por meio das biópsias e escovados citológicos. Há aumento da sensibilidade, se realizados exames de reação em cadeia de polimerase (PCR), cultura viral do tecido e imuno-histoquímica no material obtido por meio da endoscopia.
Esofagite por candida
Candida albicans é o principal agente etiológico da esofagite infecciosa e pode ocorrer com ou sem concomitância de infecção orofaríngea. O diagnóstico é suspeitado por meio de endoscopia digestiva alta, na qual se visualizam placas esbranquiçadas aderidas à mucosa e enantema, em diversos graus, associados ou não a ulcerações. A análise histopatológica confirma o diagnóstico pela identificação de esporos, hifas e pseudo-hifas compatíveis com Candida sp. A citologia e a cultura também podem ser utilizadas.1,5 O tratamento de escolha para candidíase esofágica é o fluconazol, 3 a 12 mg/kg/dia, por 14 a 21 dias, via oral ou via endovenosa, nos casos de disfagia importante. A anfotericina B, na dose de 0,5 mg/kg/dia, por 5 a 7 dias, pode ser uma alternativa para casos refratários ao fluconazol.
Esofagite por herpes
A esofagite por herpes simples também ocorre em pacientes com a imunidade preservada, na forma de infecção primária por propagação direta da lesão em orofaringe ou, mais comumente, reativação do vírus latente. Em pacientes saudáveis, o seu curso é habitualmente autolimitado; portanto, estima-se que a frequência dessa doença é maior do que a publicada. A apresentação clínica é inespecífica, caracterizando-se por dor retroesternal, disfagia, odinofagia e febre, de início agudo. O diagnóstico definitivo depende de endoscopia com biópsias dos bordos das úlceras para estudo histológico e de culturas. A presença de pequenas vesículas arredondadas ou pequenas úlceras rasas bem delimitadas, distribuídas em esôfago médio e distal, com mucosa de permeio normal são características, bem como células multinucleadas e núcleo com “aspecto de vidro fosco” à histopatologia. A associação à imuno-histoquímica e à hibridização in situ pode aumentar a sensibilidade.
Esofagite por citomegalovírus
As infecções por citomegalovírus são muito frequentes, porém observa-se que a doença clínica é rara em crianças imunocompetentes. Os sintomas são: odinofagia, dor torácica e hemorragias micro e macroscópicas. Na EDA, é visualizado enantema difuso ou enantema associado a úlceras, e na biópsia são observadas células com inclusão intranuclear (“olhos de coruja”). Vale ressaltar que a biópsia deve ser realizada na base da úlcera, onde se encontram essas células com inclusões citomegálicas. O tratamento de primeira escolha é o ganciclovir endovenoso, 10 mg/kg/dia, por 14 a 21 dias.
Esofagite cáustica
A ingestão de substâncias cáusticas (álcalis e ácidos), com a capacidade de provocar lesões teciduais por meio da destruição das membranas celulares e consequente necrose, é relativamente frequente, podendo ocorrer de forma voluntária ou inadvertida. A localização, a gravidade e a extensão das lesões, bem como a presença de complicações, dependem não apenas do tipo de substância ingerida, mas também do estado físico, da viscosidade, da concentração, do pH, da quantidade e do tempo de exposição dos tecidos à substância ingerida. O hidróxido de sódio (soda cáustica) e o hidróxido de potássio são habitualmente encontrados em produtos de limpeza em concentrações que variam de 8 a 20%, bem como em produtos cosméticos e baterias. Esses produtos acometem preferencialmente o esôfago e causam necrose por liquefação.
Os ácidos clorídrico, sulfúrico, nítrico, fosfórico e acético provocam necrose de coagulação. Como as substâncias ácidas provocam dor no contato com a orofaringe, a quantidade ingerida tende a ser menor. Ao contrário dos produtos alcalinos, mais viscosos, os ácidos tendem a passar de forma mais rápida para o estômago, produzindo menor lesão esofágica.3 O tratamento dessas afecções foge do escopo deste capítulo, mas o aspecto mais importante a ser considerado em relação a esse tema é a prevenção por meio da educação da população e regulamentação da embalagem e comercialização desses produtos.
Esofagite eosinofílica
A esofagite eosinofílica (EoE) é uma doença inflamatória crônica do esôfago, de caráter emergente e mediada por mecanismos imunológicos. Caracteriza-se por sintomas relacionados com disfunção do esôfago e infiltração da mucosa esofágica por eosinófilos, presença de 15 ou mais eosinófilos por campo de grande aumento (CGA), que se mantém após tratamento com inibidor de bomba de prótons (IBP) por 8 semanas. Deve- -se ter em mente que outras causas de eosinofilia devem ser excluídas e que a resposta ao tratamento (dieta de eliminação e/ou corticoterapia) reforça o diagnóstico; contudo, não é essencial para que ele seja confirmado.
Os sintomas variam de acordo com a idade do paciente: crianças menores de 2 anos apresentam distúrbios alimentares; pacientes na faixa etária entre 2 e 12 anos apresentam principalmente vômitos e dor abdominal; e em maiores de 12 anos pode haver presença de disfagia ou impactação alimentar.
Para a confirmação diagnóstica, é necessária a realização de endoscopia digestiva alta com biópsia de esôfago médio e distal. Os achados endoscópicos característicos de EoE incluem: edema, friabilidade de mucosa, sulcos ou linhas verticais, anéis concêntricos ou traquealização, placas ou pontos brancos e estenose; entretanto, o aspecto macroscópico pode ser normal.
Os objetivos da terapia da EoE incluem a melhora nos sintomas clínicos e da inflamação eosinofílica do esôfago. Enquanto a completa remissão dos sintomas e da inflamação é o objetivo ideal, a aceitação de uma variação de redução nos sintomas e histologia é mais realista na prática clínica. Corticosteroides tópicos (fluticasona ou budesonida), deglutidos em vez de inalados, constituem a primeira linha de terapia farmacológica no tratamento da EoE.
Pacientes sem melhora sintomática ou histológica após o uso de corticosteroides tópicos podem se beneficiar de um tratamento mais prolongado ou com doses mais altas, de corticoterapia sistêmica, de dieta de eliminação de alguns alimentos ou de realização de dilatação endoscópica. Há poucos dados que apoiem o uso de estabilizadores de mastócitos ou inibidores de leucotrienos, e, atualmente, a terapia com biológicos é considerada experimental.
A abordagem dietética específica (dieta elementar, de eliminação empírica ou de eliminação dirigida) deve ser considerada individualmente de acordo com as necessidades do paciente.
A terapia de manutenção visa a minimizar os sintomas e prevenir as complicações da EoE, bem como preservar a qualidade de vida, com mínimos efeitos adversos de longo prazo decorrentes do tratamento.
Estudante de Medicina e Autora do Blog Resumos Medicina
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