Anatomia do pâncreas.

O pâncreas é a maior das glândulas do sistema digestório e realiza funções tanto endócrinas como exócrinas. A maior parte do órgão tem função exócrina e secreta diversas enzimas envolvidas na digestão de lipídios, carboidratos e proteínas. A função endócrina do pâncreas é realizada por células que estão espalhadas por toda a estrutura da glândula, as quais participam na homeostase da glicose e que também estão envolvidas no controle da motilidade e da função da parte gastrointestinal alta. O pâncreas é de cor rosa-salmão e tem superfície lisa, lobulada e firme. O órgão é dividido em quatro partes principais: cabeça, colo, corpo e cauda. Tal divisão está baseada somente nas próprias relações anatômicas: existem poucas e sutis diferenças anatômicas e funcionais entre cada uma das partes. 

O pâncreas também possui um lobo acessório (o processo uncinado), que é anatômica e embriologicamente distinto. Nos adultos, o pâncreas apresenta de 12 a 15 cm de comprimento e possui a forma de uma “língua” de tecido, achatada, mais espessa na extremidade medial (cabeça) e mais delgada em direção à extremidade lateral (cauda). Com o envelhecimento, a quantidade de tecido exócrino tende a diminuir, assim como a quantidade de tecido conjuntivo adiposo no interior da substância da glândula, o que leva a uma atrofia progressiva que é particularmente visível em imagens obtidas por tomografia computadorizada (TC). O pâncreas está na parte interna da curva formada pela primeira, segunda e terceira partes do duodeno e se estende transversal e ligeiramente superiormente ao longo da parede posterior do abdome até o hilo do baço, por trás do estômago. Não está em um único plano, mas efetivamente repousa sobre outras estruturas do espaço retroperitoneal e coluna vertebral, formando assim uma curva rasa da qual o colo e a parte medial do corpo são as mais anteriores. Em razão de sua forma achatada, diz-se comumente que o pâncreas, particularmente o corpo, apresenta faces e margens.

Divisão do pâncreas

Cabeça

A cabeça do pâncreas está situada à direita da linha média, anteriormente e também à direita da coluna vertebral, no interior da curvatura formada pelo duodeno. Corresponde à parte mais espessa e larga do pâncreas, mas ainda assim é achatada no plano anteroposterior. Superiormente, é adjacente à primeira parte do duodeno, mas como o duodeno apresenta mesentério curto próximo ao piloro, nesta região é anterior à parte superior da cabeça. A margem duodenal da cabeça é achatada e ligeiramente côncava, e está firmemente aderida à segunda parte do duodeno. Às vezes, uma pequena parte da cabeça está de fato mergulhada na parede da segunda parte do duodeno. Nessa área, as artérias pancreaticoduodenais superior e inferior estão entre a cabeça e o duodeno. A margem inferior do órgão é superior à terceira parte do duodeno e é contínua com o processo uncinado. Próximo da linha média, a cabeça é contínua com o colo. O limite entre a cabeça e o colo é com frequência demarcado anteriormente pelo sulco da artéria gastroduodenal e posteriormente por um sulco similar, porém mais profundo, o qual contém a união das veias mesentérica superior e esplênica onde formam a veia porta.

Colo

O colo do pâncreas tem aproximadamente 2 cm de largura e se une à cabeça e ao corpo. É com frequência a parte mais anterior da glândula e é definida como a parte do pâncreas situada anteriormente à veia porta, a qual está intimamente relacionada com a parte superior da face posterior. A parte mais inferior do colo do pâncreas é anterior à veia mesentérica superior imediatamente antes da formação da veia porta.
Essas relações são importantes durante a cirurgia de câncer pancreático, pois o envolvimento tumoral maligno desses vasos pode tornar a ressecção impossível. A face anterior do colo está coberta com peritônio e é adjacente ao piloro imediatamente inferior ao forame omental. As artérias gastroduodenal e pancreaticoduodenal superior anterior descem anteriormente à glândula, na região da junção do colo com a cabeça do pâncreas.

Corpo

O corpo do pâncreas é a parte mais longa da glândula e estende-se do lado esquerdo do colo até a cauda. Em cortes transversais, parece ligeiramente triangular e se torna progressivamente mais fino e menos largo à medida que se aproxima da cauda. Sua apresentação é descrita por meio de três faces: anterossuperior, posterior e anteroinferior.

Face anterossuperior: A face anterossuperior do pâncreas constitui a parte mais anterior da glândula, próxima ao colo. Lateralmente, se estreita, é ligeiramente mais superior e compartilha a margem anterior com a face anteroinferior. É coberta por peritônio, que se estende desde a glândula anteroinferiormente, até se tornar contínuo com a lâmina anterior ascendente do omento maior. A lâmina superior do mesocolo transverso está refletida e é contínua com a lâmina posterior descendente do omento maior, imediatamente acima da margem anterior e, portanto, quase não participa da cobertura da face anterossuperior. A face está separada do estômago pela bolsa omental.

Face posterior: A face posterior do pâncreas é desprovida de peritônio. É anterior à aorta, à origem da artéria mesentérica superior, ao pilar esquerdo do diafragma, à glândula suprarrenal esquerda, ao rim esquerdo e aos vasos renais, sobretudo à veia renal esquerda. A face posterior está intimamente relacionada com a veia esplênica, que está entre a mesma e as outras relações posteriores e corre da esquerda para a direita, formando um sulco raso ou mesmo um “túnel” quase totalmente coberto na substância da glândula. O rim esquerdo também está separado da face posterior por fáscia renal e corpo adiposo pararrenal.

Face anteroinferior: A face anteroinferior do pâncreas começa como uma faixa estreita logo à esquerda do colo. À medida que o corpo se estende lateralmente a faixa se alarga, aumentando assim a face anteroinferior do corpo. É coberta por peritônio que é contínuo à lâmina posteroinferior do mesocolo transverso. A quarta parte do duodeno, a flexura duodenojejunal e as alças do jejuno localizam-se inferiormente. Com frequência, a extremidade lateral da margem inferior é superior e posterior à flexura esquerda do colo. O peritônio da lâmina anterossuperior do mesocolo transverso está refletido sobre a parte superior da face anteroinferior, na linha da margem anterior, onde é contínuo com a lâmina posterior do omento maior. Lateralmente, o ápice do músculo suspensor do duodeno (ligamento de Treitz) pode se constituir em uma relação anterior da face anteroinferior do corpo.

Margem superior: Do lado direito, a margem superior do pâncreas é, no início, romboide e pouco achatada, porém à medida que o corpo da glândula se estende para a esquerda, a superfície se altera até se tornar mais estreita e afilada. Uma tuberosidade – o túberomental – geralmente se projeta da extremidade direita da margem superior, acima do nível da curvatura menor do estômago, em contato com a superfície posterior do omento menor. A margem superior está relacionada com o tronco celíaco. A artéria hepática comum corre para a direita logo acima da glândula. A artéria esplênica segue para a esquerda, descrevendo um trajeto frequentemente bastante tortuoso ao longo da margem superior, e tende a se elevar acima do nível dessa margem em vários pontos do seu trajeto.

Margem anterior: A margem anterior do pâncreas separa a face anterossuperior da anteroinferior. As duas lâminas do mesocolo transverso divergem ao longo dessa margem. A lâmina superior reflete-se inferiormente depois de uma distância muito curta até a lâmina descendente (posterior) do omento maior, enquanto a lâmina inferior segue inferior e posteriormente sobre a face anteroinferior.

Margem inferior: A margem inferior do pâncreas separa a face posterior da anteroinferior. Na extremidade medial da margem inferior, adjacente ao colo do pâncreas, os vasos mesentéricos superiores emergem posteriormente à glândula. Mais lateralmente, a veia mesentérica inferior corre sob a margem até se juntar à veia esplênica na face posterior. Este local é útil para a identificação da veia mesentérica inferior durante as ressecções do colo no lado esquerdo e nas imagens obtidas por TC.

Cauda

A cauda do pâncreas é a parte mais estreita e mais lateral da glândula e está entre as lâminas do ligamento esplenorrenal. É contínua medialmente com o corpo e tem de 1,5 a 3,5 cm de comprimento nos adultos. Pode terminar na base do ligamento esplenorrenal ou estender-se para cima até bem próximo ao hilo esplênico. Nesses casos, a cauda pode ser lesada durante a ligadura dos vasos esplênicos ou durante uma esplenectomia. Posteriormente, está relacionada tanto com a artéria esplênica e seus ramos como com a veia esplênica e suas tributárias. A ponta da cauda pode estar em contato com o hilo esplênico.

divisão do pâncreas

Processo uncinado

O processo uncinado do pâncreas projeta-se a partir da extremidade lateral inferior da cabeça da glândula. Embriologicamente, é separado do restante da glândula, sendo, portanto, posterior à veia mesentérica superior e por vezes também à artéria mesentérica superior, na região em que descem em contato íntimo com a face anterior e seguem para diante até a raiz do mesentério ileal. Posteriormente, o processo uncinado é anterior a aorta e, inferiormente, repousa sobre a superfície superior da terceira parte do duodeno. Os tumores do processo uncinado não obstruem o ducto colédoco, porém com frequência comprimem a terceira parte do duodeno como consequência de sua estreita relação.

Drenagem venosa

A drenagem venosa do pâncreas é basicamente para o sistema porta. A cabeça e o colo drenam principalmente por intermédio das veias
pancreaticoduodenais superior e inferior. O corpo e a cauda drenam predominantemente para veias pequenas que correm diretamente para a veia esplênica ao longo da superfície posterior da glândula ou, às vezes, diretamente para a veia porta. As veias são numerosas e curtas, características que podem causar sangramento preocupante durante a mobilização cirúrgica da cabeça e do colo da glândula. Há canais venosos pequenos entre todas as partes da glândula e as veias retroperitoneais, e esses canais, que finalmente drenam para as veias lombares, podem se hipertrofiar e se tornar clinicamente importantes nos casos de hipertensão portal.

Drenagem linfática

A drenagem linfática do pâncreas é extensa. Vários grupos de linfonodos podem receber a drenagem proveniente de cada uma das regiões da glândula, o que explica em parte o mau prognóstico que acompanha a ressecção dos tumores pancreáticos. Os capilares linfáticos surgem ao redor dos ácinos pancreáticos. Os vasos linfáticos maiores seguem o suprimento arterial e drenam para os linfonodos situados ao redor do pâncreas e para grupos de linfonodos adjacentes. Os linfáticos da cauda e do corpo drenam principalmente para os linfonodos pancreáticos e esplênicos, embora alguns drenem diretamente para linfonodos pré-aórticos. A drenagem linfática do colo e da cabeça é mais ampla: a linfa segue para linfonodos situados ao longo das artérias pancreaticoduodenal, mesentérica superior e hepática. Alguns desses linfáticos também drenam para os linfonodos pré-aórticos e para os linfonodos do tronco celíaco. Não há evidências de ductos linfáticos no interior das ilhotas pancreáticas.

Pâncreas exócrino

O pâncreas exócrino é uma glândula acinosa ramificada, circundada por um delicado tecido conjuntivo frouxo que forma lóbulos incompletos em seu interior. É composto por células secretoras piramidais dispostas predominantemente como agrupamentos esféricos, ou ácinos. Do interior de cada ácino secretor, origina-se um ducto intralobular intercalado estreito, revestido inicialmente por células centroacinares achatadas ou cuboides. Esses pequenos dúctulos formam conexões ramificadas que correm no interior e entre os ácinos adjacentes, o que explica por que ductos pancreáticos intralobulares estruturalmente diferentes são infrequentes (Kerr, 1999, para detalhes). Mais distalmente, as células centroacinares achatadas ou cuboides são substituídas por epitélio cilíndrico e eventualmente, por epitélio colunar nos ductos interlobulares maiores. Estes últimos são circundados pelo tecido conjuntivo frouxo dos septos, que contém músculo liso e fibras nervosas autônomas. Há células neuroendócrinas entre as células colunares dos ductos, e os mastócitos são numerosos no tecido conjuntivo circunjacente.

Células acinares: as células acinares da parte exócrina do pâncreas têm um núcleo basal e, no domínio citoplasmático basal, um retículo endoplasmático granuloso abundante que dá a elas a característica basofílica da coloração. Na região apical, grânulos de secreção densos com zimogênio coram-se intensamente com eosina. Na região supranuclear, há um proeminente complexo de Golgi supranuclear que é circundado por grânulos grandes delimitados por membrana. Esses grânulos contêm os constituintes protéicos da secreção pancreática, que inclui enzimas que só se tornam ativas depois de liberadas. Neurônios ganglionares e cordões de células epiteliais indiferenciadas também são encontrados dentro dos ácinos.

Células estreladas: as células estreladas do pâncreas consistem em um dos vários tipos de células contidas na parte exócrina do pâncreas. São reguladas por estímulos autócrinos e parácrinos, e compartilham muitas características com suas correspondentes hepáticas. São células semelhantes aos miofibroblastos que são encontradas no espaço periacinar, onde seus longos processos citoplasmáticos envolvem a base do ácino, sendo também encontradas nas regiões perivascular e periductal do pâncreas. Foram consideradas elementos-chave da biopatologia dos principais distúrbios do pâncreas exócrino, entre eles a pancreatite crônica e o câncer de pâncreas

Pâncreas endócrino

O pâncreas endócrino consiste nas ilhotas pancreáticas de Langerhans, compostas por grupos esféricos ou elipsoides de células incrustados no tecido exócrino. O pâncreas humano pode conter mais de um milhão de ilhotas, que em geral são mais numerosas na cauda. Uma ilhota é uma massa de células poliédricas, e cada uma dessas células está em íntimo contato com os capilares fenestrados e com alguma rica inervação autonômica. É preciso empregar procedimentos de coloração, ou técnicas imuno-histoquímicas, especializados para distinguir os três principais tipos de célula, designados como alfa, beta e delta. A Figura 70.11 mostra a organização geral dessas células. As células mais numerosas, tipos alfa e beta, secretam glucagon e insulina, respectivamente. As células alfa tendem a se concentrar na periferia das ilhotas, e as células beta são encontradas mais centralmente. O terceiro tipo – a célula delta – secreta somatostatina e gastrina e, assim como as células alfa, concentra-se na periferia das ilhotas. Um tipo secundário de célula – a célula F – secreta o polipeptídio pancreático (PP), que é armazenado em grânulos de secreção menores. Os neurotransmissores autonômicos, acetilcolina (ACh) e noradrenalina, afetam a secreção das células das ilhotas: a ACh aumenta a liberação de insulina e glucagon, a noradrenalina inibe a liberação de insulina induzida pela glicose e as duas também podem afetam a secreção de somatostatina e PP.

Bibliografia

Anatomia Grey’s – a base anatômica da prática clínica – 40º edição.

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Estudante de Medicina e Autora do Blog Resumos Medicina